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Principais Questões sobre Alimentação nos Primeiros Anos de Vida e a Prevenção da Obesidade

30 maio 2022

Sistematizamos as principais questões abordadas no Encontro com a Especialista Jorginete de Jesus Damião, nutricionista, professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), realizado no dia 29/06/2021.

Para a abordagem da obesidade é fundamental reconhecê-la como uma condição complexa que envolve múltiplas determinações como: fatores ambientais, políticos, sociais, econômicos, culturais e subjetivos. Envolve ainda as desigualdades sociais e as consequências de um sistema alimentar agroindustrial. O sistema alimentar agroindustrial traz consequências importantes tanto para o meio ambiente como para a saúde das pessoas/coletividade.Por esses motivos, a obesidade precisa ser abordada com estratégias que analisem o meio em que a pessoa vive, por exemplo.

É importante atentar para as duas faces da insegurança alimentar: obesidade e desnutriçãoA condições sociais injustas como habitação, pobreza, instabilidade alimentar e falta de cuidados de  saúde colocam os indivíduos mais vulneráveis em situações de adoecimento.

A alimentação nos primeiros anos de vida e obesidade estão relacionadas ao aumento do sobrepeso e obesidade em todos os grupos e, de uma forma geral, com as doenças cardiovasculares, hipertensão, doenças cerebrovasculares, entre outras.

A saúde e os demais setores devem estar atentos acerca da prevenção da obesidade infantil, fatores sociais, desigualdade social e de saúde, especialmente atentos ao racismo e como as intervenções de cuidado podem contribuir para diminuir as iniquidades sociais.

O Atlas da Obesidade Infantil no Brasil, documento do Ministério da Saúde, aponta que 18,9%, com até 02 anos de idade, das nossas crianças apresentam excesso de peso, em crianças de 02 a 04 anos, 14,3%  apresentam excesso de peso e em crianças de 04 a 09 anos, 29,3% apresentam excesso de peso. O mesmo documento aponta que 49% das crianças de 06 a 23 meses, que participaram da pesquisa, fazem consumo de algum tipo de alimento ultraprocessado. Desigualdade no acesso aos alimentos in natura e minimamente processados ainda é uma barreira.

Veja também: Postagem sobre o tema

 

O Guia Alimentar para Crianças Brasileiras Menores de 2 Anos (2019) é um importante documento para orientação das famílias brasileiras no que diz respeito ao cuidado da alimentação das crianças. Ele apresenta 12 passos:

1º passo: amamentar até 02 anos ou mais, oferecer somente o leite materno até os 06 meses.

2º passo: oferecer alimentos in natura ou minimamente processados, além do leite materno a partir dos 06 meses.

  • Alimentos in natura: obtidos diretamente de plantas ou animais sem ter sofrido qualquer tipo de alteração
  • Minimamente processados: são alimentos in natura que antes da sua aquisição, foram minimamente alterados
  • Alimentos processados: produtos fabricados essencialmente com adição de sal e açúcar a uma alimento in natura ou minimamente processado 
  • Alimentos ultraprocessados:produtos cuja fabricação envolve várias etapas, técnicas de processamento e ingredientes, muitos deles de uso exclusivamente industrial.

3º passo: oferecer água própria para o consumo à criança, ao invés de sucos e outras bebidas açucaradas.

4º passo: oferecer comida amassada quando for iniciada a introdução alimentar, outros alimentos além do leite materno.

5º passo: não oferecer açúcar, nem preparações com açúcar até os 2 anos de idade.

6º passo: não oferecer alimentos ultraprocessados para crianças.

7º passo: cozinhar a mesma comida para a criança e para a família.

8º passo: zelar para que o momento da refeição da criança seja um momento de experiências positivas, afetividade e aprendizado.

9º passo: prestar atenção nos sinais de fome e saciedade da criança e conversar com ela durante a refeição

10º passo: cuidar da higiene em todas as etapas da refeição da criança e da família.

11º passo: oferecer à criança alimentação saudável, também fora de casa.

12º passo: proteger a criança da publicidade de alimentos.

A obesidade é uma das faces da insegurança alimentar. Nesse sentido, a sociedade, o setor saúde e outros setores devem estar atentos à violação dos direitos humanos. A segurança alimentar deve estar dentre as pautas da agenda das políticas públicas no Brasil para adequação e acesso à alimentação saudável por todos.

Abaixo, a gravação do Encontro na íntegra.

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Perguntas & Respostas

1. Existe algum grupo alimentar contra indicado para as crianças que irão iniciar a complementação alimentar?

Sim. Existem duas contra indicações principais, segundo o Guia Alimentar do Ministério da Saúde (2019). Os alimentos ultraprocessados e os alimentos com açúcar ou com adição de açúcar.

 

2. Com frequência os pais aparecem nas consultas com dificuldades de introduzir os alimentos nas refeições das crianças e acabam abrindo mão do esforço de manter uma alimentação mais saudável e ofertam alimentos mais fáceis e processados, como orientar essas situações?

É importante avaliar como é a rotina alimentar dessa família e como é sua alimentação, suas escolhas alimentares, pois se a família não faz escolha por alimentos saudáveis, isso por si só, já é um desafio. 

A abordagem familiar é importante para compreender as dificuldades da criança no processo de aceitação dos alimentos. 

Outro aspecto importante são as expectativas geradas pelo processo de introdução alimentar para a criança. É importante que os profissionais de saúde alertem as famílias que as crianças respondem de forma diferente e que a alimentação também é um processo de aprendizado para a criança, e este pode ser desafiador para ela.

 

3. Como deve ser a abordagem da Atenção Primária à Saúde na introdução alimentar da criança?

A abordagem familiar, o contexto alimentar da família e o contexto de vida da família interferem no processo de introdução alimentar da criança. 

Incorporar a discussão dos alimentos ultraprocessados na orientação para as famílias é fundamental. Valorizar o cozimento dos alimentos em casa, a divisão de tarefas, a cultura familiar, são estratégias importantes para discussão da alimentação saudável. 

Os profissionais devem estar atentos às orientações dadas no sentido de serem sensíveis às condições sociais e financeiras a que as famílias e suas crianças estão inseridas.

 

4. Como orientar e conduzir um caso de uma criança com sobrepeso e obesidade?

É importante abordar a família nesses casos, a fim de compreender quais os desafios relacionados à alimentação estão presentes. 

Deve-se atentar para não culpabilizar a família, visto que o sobrepeso ou obesidade são problemas com base multifatorial. 

É importante identificar as pessoas que cuidam da criança e pensar em trabalhar estratégias de orientação, informação e outros aspectos para o enfrentamento do sobrepeso e da obesidade.

 

5. Quando o açúcar deve ser incluído na alimentação da criança? Até quando evitá-lo e quando introduzi-lo?

O açúcar não necessariamente precisa ser introduzido na alimentação da criança. Ainda assim, quando consumido, deve ser em pequenas quantidades.

Até os dois anos de idade a criança não deve consumir açúcar. Após essa idade, pode ser introduzido em alguma preparação alimentar. Ainda assim, evitá-lo é a melhor opção.

 

6. A insegurança alimentar e as dificuldades financeiras da população são problemas comuns na prática dos profissionais de saúde. É muito difícil trabalhar obesidade ou mesmo desnutrição em um contexto em que a insegurança alimentar aumenta e as pessoas tem dificuldade em acessar alimentos de qualidade ou não tem tempo de produzir seu alimento de forma mais saudável. Como lidar com esse desafio?

É muito importante trabalhar na perspectiva intersetorial, na perspectiva de rede de atenção e rede intersetorial. Tendo em vista os fatores que contribuem para a obesidade é multifatorial é prudente que as estratégias para o enfrentamento da pandemia da obesidade sejam intersetoriais.

 

7. Algumas famílias ainda valorizam a aparência de crianças “gordinhas”, pois relacionam essa característica com algo saudável. Como abordar isso?

Ainda é recorrente essa impressão no imaginário do brasileiro, pois a experiência com a desnutrição ainda é algo próximo de nós. Nesse sentido, a obesidade ainda é vista como algo saudável no casos das crianças. 

Existem estratégias para trabalhar essas questões culturais, espaços de educação em saúde, oficinas culinárias, conversas sobre a alimentação e a saúde, por exemplo podem ser estratégias para contribuir com a desconstrução da cultura de que é aceitável criança acima do peso, como se essa condição não trouxesse malefícios para a saúde da criança. 

 

8. Qual o papel das Políticas Públicas nesses cenários?

As políticas públicas são fundamentais para a mudança desse cenário, para a construção de um sistema alimentar mais justo, saudável e sustentável e para possibilitar que as pessoas tenham acesso a alimentos mais saudáveis, à renda, ao trabalho e à terra.

 

Como citar

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira. Portal de Boas Práticas em Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente. Postagens: Principais Questões sobre Alimentação nos Primeiros Anos de Vida e a Prevenção da Obesidade. Rio de Janeiro, 30 mai. 2022. Disponível em: <https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/atencao-crianca/principais-questoes-sobre-alimentacao-nos-primeiros-anos-de-vida-e-a-prevencao-da-obesidade/>.

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