Sistematizamos as principais questões abordadas durante Encontro com a Especialista Anna Maria Chiesa, Professora do Departamento de Enfermagem e Saúde Coletiva, da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP), realizado em 08/10/2019.
Abaixo a gravação do Encontro na íntegra.
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Perguntas & Respostas
1. O uso de celulares e tablets prejudicam o desenvolvimento infantil?
O consenso internacional de diferentes Associações de Pediatria é que a criança não faça uso de telas antes dos 2 anos de idade. Nesse período o uso de telas não agrega nenhum benefício ao desenvolvimento infantil. Por outro lado, essa prática faz com que a criança perca oportunidade de contato e estímulos mais complexos e necessários ao seu desenvolvimento.
Por exemplo, uma criança sentada no chão, brincando com uma bacia, uma tampa de plástico, colher de pau, chocalho, etc., tem mais oportunidade de riqueza e possibilidades de atividades, descobrindo texturas, sons, movimentos, etc. Em um celular ou tablet a criança fica passiva e deixa de explorar outras habilidades e aquisições. Um desenho que se repete, de forma programada para todas as crianças, não possibilita essa interação e não traz a sensação de que há alguém cuidando dela.
O desenvolvimento integral envolve a parte motora, tátil, olfativa, auditiva, treino de linguagem, entre outros. Por isso a importância de interação com o meio. A partir de 2 anos pode-se fazer uso de tela com tempo limitado (até uma hora por dia) e sempre com a observação de um adulto. O importante é que a tela não seja um substituto do cuidado.
2. Quais são os sinais de atraso que devem alertar os profissionais da Atenção Primária para encaminhamento?
A Estratégia de Saúde da Família tem oportunidade de conhecer profundamente a história da criança e de sua família, pois pode acompanhá-la desde o período pré concepcional até seu nascimento e desenvolvimento. A equipe deve avaliar o bebê continuamente. Identificar temperamentos é uma questão muito importante, inclusive observando como é a relação da mãe com a criança, como ela se refere a ela, se algo chama a atenção, se é uma criança que se comunica ou se move mais ou menos, etc.
Não há um protocolo rígido para identificar atrasos no desenvolvimento da criança. Para isso, é necessário dedicar tempo e olhar com atenção como a mãe e seu bebê se reconhecem nesse processo. A estrutura emocional e a rede familiar da mãe são decisivos na forma como ela pode cuidar de seu bebê.
É importante observar com atenção crianças apáticas, que não choram, comem pouco, que não demandam atenção e cuidado, principalmente quando não se conhece o histórico familiar (se há casos de violência ou abuso). Também deve-se ter atenção especial quando a criança é extremamente irritada, tem dificuldade de ganhar peso e apresenta infecção por repetição, por exemplo. A medida de perímetro cefálico também deve ser acompanhada e avaliada e, caso a medida não acompanhe a curva esperada, a criança deve ser encaminhada para avaliação de especialistas.
Deve-se salientar que os marcos do desenvolvimento não entram sozinhos na avaliação da criança e eles devem ser analisados em um contexto maior: crescimento, peso, altura, ocorrência de infecções e, por fim, questões do desenvolvimento.
Para isso, o profissional pode buscar informações sobre o dia a dia da criança, perguntando como é sua rotina, quem a coloca para dormir, como é esse ritual, sua alimentação, etc. Assim consegue-se avaliar se o atraso é realmente um atraso ou a falta de oportunidade.
3. É verdade que o desenvolvimento pode ser estimulado ainda na gestação? Como funciona isso? Tem algo que pode ser feito nos grupos de pré-natal?
Sim, é verdade. O último trimestre da gestação é uma janela de oportunidade, ou período sensível, pois as áreas sensoriais, de linguagem e das funções executivas do feto já estão ativas.
Para desenvolvê-las é preciso estimulá-las rotineiramente. Recomenda-se ouvir músicas, a mãe e o pai conversarem com o bebê ainda na barriga, fazer massagens e ter um ritual. Vale lembrar que tanto as situações boas como as situações de estresse materno afetam o feto, já que o útero materno não é uma barreira para as emoções e vivências da mãe nesse período.
No site https://ocomecodavida.com.br/, existem muitas opções de material para a compreensão e atividades para esse desenvolvimento, que podem ser usadas pelos profissionais em grupos de pré-natal.
4. O que deve ser estimulado em cada fase da infância?
A Caderneta da Criança tem um instrumento de vigilância do desenvolvimento de crianças de 0 a 12 meses e de 12 a 36 meses. Além disso, a Caderneta tem uma seção com dicas bastante simples com o que a família pode fazer para estimular o desenvolvimento das crianças. Os profissionais de saúde podem orientar as famílias a lerem e utilizarem essas estratégias propostas, divididas por faixa etária, apontando a relevância do seu conteúdo.
5. Como intervir nos casos onde há dificuldade de vínculo entre pai-mãe-criança?
Vínculo não é algo natural e espontâneo. Quando se acredita na função biológica, acredita-se que a mãe vai saber cuidar de seu filho, relacionando o nascimento do bebê ao nascimento de uma mãe. Mas na verdade não nasce uma mãe, nasce a potência uma mãe.
Há instrumentos que podem ser usados durante a gestação, como a Escala de Apego Materno-Fetal. Esse é um indicador para avaliar como está o interesse da mãe com o feto e depois com o bebê. Há sinais de dificuldade de vínculo, já durante a gestação, que podem ser percebidos pelos profissionais de que algo não vai bem. Por isso é importante trabalhar a importância do vínculo, já no pré-natal, para que estes casos possam ser melhor acompanhados. Em casos de indícios de não interesse pela gestação ou pelo bebê, a mulher pode ser encaminhada para atendimento especializado.
No puerpério, é imprescindível identificar a depressão pós-parto, que pode ser avaliada por escalas, como a Escala de Depressão Pós-Parto de Edimburgo.
6. Música clássica contribui para o desenvolvimento infantil?
Sim, a música como um todo contribui para o desenvolvimento infantil, não necessariamente as músicas clássicas. O processo de desenvolvimento é a inclusão do bebê na dimensão humana, inclusive da cultura do seu meio. Por isso, a escolha do tipo de música deve ser de cada núcleo familiar.
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