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Principais Questões sobre Promoção e Atenção ao Neurodesenvolvimento

23 nov 2019

Sistematizamos as principais questões sobre Promoção e Atenção ao Neurodesenvolvimento, abordadas durante o Encontro com as Especialistas do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), Miriam Calheiros (Fisioterapeuta), Natalia Molleri (Terapeuta Ocupacional) e Maria Luciana Mayrink (Fonoaudióloga), realizado em 15/07/2019.

Veja também: Postagem sobre o tema

Durante o desenvolvimento de uma criança existem os períodos críticos, nas quais alguns sistemas do Sistema Nervoso Central estão mais susceptíveis à plasticidade, ou seja, possuem mais mobilidade para o desenvolvimento de novos contatos e novas sinapses. É importante entender que a duração e o início desses períodos críticos são específicos para cada sistema, dependem da idade da criança e da exposição da criança à experiência. Considera-se que as experiências vividas durante este período da vida do bebê produzem um impacto duradouro no seu desenvolvimento e são a base para os processos de aprendizagem futura.

É fundamental acompanhar o desenvolvimento durante a infância. Neste sentido, o papel da equipe de Atenção Primária é imprescindível, particularmente pelo contato que as equipes tem com as famílias.

O ambiente onde o bebê está inserido é fundamental para seu desenvolvimento, por isso ele deve ter estímulos. A estimulação precoce desempenha papel importante no desenvolvimento do cérebro do bebê. Os estímulos podem ser: oportunidades de exploração tátil, exploração do corpo em diferentes posturas e contextos, estimulação visual, estimulação auditiva, do brincar etc. Não são necessários recursos específicos. A mudança de ambiente, visitar praças, parques, praias, colocar a criança em contato com outra crianças são só alguns exemplos disso.
As crianças aprendem pela repetição e pela imitação, e a forma natural de aprender é brincando, interagindo com o outro, tocando e explorando o ambiente a sua volta.

A Caderneta da Criança é um instrumento fundamental no acompanhamento e monitoramento do desenvolvimento infantil.

O monitoramento das várias etapas do desenvolvimento do bebê está na Caderneta da Criança, que além de acompanhar o desenvolvimento do crescimento, contempla os marcos do desenvolvimento típico, o comportamento, o brincar, o aprender, o falar, se locomover etc.

O correto preenchimento e uso da Caderneta da Criança pelos profissionais de saúde deve ser estimulado, já que permite a detecção precoce de desvios.

Uma vez detectada alterações no desenvolvimento infantil a criança precisa ser encaminhada para a atenção especializada.

 

Abaixo a gravação do Encontro na íntegra.

O Encontro com o Especialista é uma webconferência realizada quinzenalmente com especialistas de diversas áreas. Para participar é necessário se inscrever no evento, assim você poderá enviar dúvidas que serão respondidas ao vivo!

Fique atento à agenda de Encontros com o Especialista. Inscreva-se já!

 

Perguntas & Respostas

1. O que fazer quando suspeito que uma criança não atingiu o esperado para a idade?

Alguns testes, como os de triagem universal, já vão dizer de algumas alterações. Ainda assim é preciso ter um olhar cuidadoso para outras alterações relacionadas aos marcos do desenvolvimento. Nesse sentido, quem está mais próximo do território deve ser capaz de conseguir identificar tais alterações.

Se uma criança não conseguiu atingir o esperado para a idade é importante que as equipes de Atenção Primária façam o encaminhamento o mais precoce possível para a atenção especializada. É importante também que os profissionais orientem as famílias. Na própria Caderneta da Criança existe uma parte que é voltada para as famílias, com orientações sobre o brincar e o desenvolvimento, por faixa etária.

Às vezes a criança apresenta algum desvio, mas isso não significa necessariamente um transtorno ou alguma condição patológica. É importante o profissional estar sempre fazendo o cruzamento de informações, como por exemplo se a criança tem algum fator de risco. Se este for o caso, pode-se avaliar a criança em intervalos menores.

 

2. Por que é importante colocar o bebê de barriga para baixo desde cedo?

Às vezes as mães tem medo de colocar os bebês de barriga para baixo. Existe uma recomendação da Associação Americana de Pediatria e da Associação Brasileira de Pediatria, de que os bebês não devem dormir de barriga para baixo. Mas quando eles estiverem acordados é muito importante que eles sejam colocados nessa posição. Quando eles estiverem de barriga para baixo alguém deve estar à sua frente, estimulando-o, para que ele possa se interessar e levantar a cabeça, começar a se empurrar pelos bracinhos. Um bebê recém-nascido não consegue ficar muito tempo nesta posição e ele deve ter supervisão. Mas este estímulo deve ser dado desde cedo e ir aumentando conforme a tolerância do bebê.

 

3. O que vocês acham do bebê conforto? Que orientações podemos dar sobre seu uso? E a partir de qual idade?

O bebê conforto tem uma indicação. O que não se pode é colocar o bebê e deixá-lo de uma forma desconfortável, “todo torto”. É muito importante que ele fique todo alinhado, sem a cabecinha pendente.

Quando o bebê é menor, há algumas adaptações que podem ser feitas, como por exemplo o travesseiro de rolinho que fica em volta da cabeça e os apoios para as laterais do corpo. Também deve-se prender o cinto de segurança para que ele não corra o risco da criança cair para frente.

Quando o bebê é pequeno, a mãe costuma usar o bebê conforto para transportá-lo. Quando ele cresce, a indicação é que o bebê conforto seja usado em crianças que já tenham algum controle da cabeça.

Por fim, vale ressaltar que o bebê deve sim usar o bebê conforto. Isso porque ele não deve ficar restrito à somente uma postura, deve experimentar diversas, inclusive sentado. Para bebês que ainda não tem controle de tronco ou cabeça, deve-se colocar suporte acolchoado para que ele fique alinhado.

Lembrando que o transporte da criança em carro deve ser feito sempre no bebê conforto, com as almofadas acolchoadas, para sua segurança.

 

4. Quais os benefícios de colocar o bebê no chão?

Conforme o bebê vai se desenvolvendo, vai ganhando o movimento de extensão da cabeça, ganhando controle do próprio corpo ele consegue até rolar sozinho. É fundamental colocar o bebê no chão, se possível em cima de um tapetinho emborrachado, para que ele possa ter contato com uma superfície mais dura que a da cama por exemplo. Não tendo um tapete emborrachado, pode-se adaptar à realidade de cada família, colocando no chão um edredom, uma esteira, etc.

Conforme o bebê vai alcançando estruturas mais altas, ele vai precisando de mais espaço. O “chiqueirinho” pode parecer mais seguro, mas ele deixa o bebê confinado em um espaço restrito.

O chão também garante maior espaço para que ele possa explorar, não há risco de queda, os brinquedos podem estar dispostos ao redor da criança para que ele possa interagir. Assim ele consegue explorar outras opções também, como a fala, explorar o outro, estímulo com os olhos, a cabeça, tentar alcançar os objetos, etc.

 

5. Como orientar a família sobre a estimulação em situações de muita vulnerabilidade social?

Além de tentar oferecer estímulos que sejam benéficos para a criança deve-se tentar protegê-la de alguns estímulos que podem ser nocivos para ela. Neste contato com as família é que se consegue criar um ambiente de cuidado.

Pensar junto com a família a partir da sua realidade, algumas possibilidades, como parques, praças, opções culturais gratuitas. Também sugerir que converse com a criança, brinque, estimule e crie laços afetivos. É através destes laços e relações que a criança vai se sentir segura e construir confiança.

Vale lembrar que se as equipes de saúde percebem grande vulnerabilidade social em determinada família, deve-se acionar equipamentos próprios da assistência social para acionar a Rede e garantir direitos.

 

6. As orientações sobre estimulação precoce para crianças com alterações no desenvolvimento, podem ser dadas em grupo?

Sim, esta inclusive é uma boa estratégia.

É importante diferenciar os grupos de orientação de reabilitação. A reabilitação ocorre com especialistas, focando questões individuais. Já os grupos de orientação de famílias podem abordar temas de como estimular as crianças em casa, como posicioná-la adequadamente, etc. Na experiência dos grupos as próprias famílias acabam encontrando soluções para os problemas que levantam.

A Atenção Primária é o ambiente ideal para que isso ocorra, e pode-se utilizar estratégias como sala de espera em dias de puericultura ou vacinação até grupos de famílias. Cada unidade deve pensar em estratégias que mais façam sentido para sua clientela.

 

7. Vocês indicam algum material para ajudar na capacitação dos profissionais da atenção básica no desenvolvimento infantil?

Há diversos materiais disponíveis. Um deles é o Curso disponibilizado pelo Unasus sobre estimulação precoce. Ele foi desenvolvido pela equipe do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz) e está disponível para acesso.

 

8. O que vocês acham do uso do celular por crianças pequenas, menores de um ano, menores de dois anos? Isso atrapalha o desenvolvimento?

Tem-se falado cada vez mais do acesso e uso das telas por crianças. Isso inclui celular, tablet, computador e televisão.

Este uso tem trazido grande impacto negativo, principalmente no desenvolvimento da linguagem. Isso se traduz em crianças que tem mais dificuldade de interagir, falam muito pouco, não mantém atenção, chegando a ter comportamentos que lembram crianças do espectro autista. Isso não significa que celular leva ao autismo, mas que as crianças estão sendo expostas, de uma forma muito precoce, à imagens inanimadas. Isso vai contra o consenso de que as crianças aprendem através das interações, do contato com o outro, da exploração, favorecendo as conexões neurais.

A linguagem também funciona desta maneira. Ao conversar com uma criança ela começa a vocalizar junto. A criança, para se distrair, só precisa da voz do outro. Não há necessidade de se colocar telas para substituir isso. Quando a criança olha para a tela ela deixa de olhar o que acontece ao seu redor. Isso já no período pré linguístico, que é super importante ao final do primeiro ano de vida.

A Sociedade Americana de Pediatria fez uma recomendação em 2016, aconselhando não expor crianças menores de 2 anos a nenhum tipo de tela. Entre 2 a 5 anos de idade a exposição à telas pode ocorrer até 1 hora por dia.

 

9. Como adaptar os testes de desenvolvimento como o Bayley para crianças especiais? Por exemplo, com paralisia cerebral e surdez.

Todos os protocolos são elaborados a partir de habilidades de desenvolvimento onde a maioria das crianças alcançam estes marcos. Algumas crianças já apresentam especificidades, como prejuízo motor no caso de crianças com paralisia cerebral ou prejuízo sensorial como no caso das crianças com surdez.

Os testes como Bayley e outros testes protocolares não podem ser utilizados na sua pontuação clara, pois já se sabe de antemão que estas crianças não vão pontuar escores nas áreas que apresentam alguma deficiência, levando à uma pontuação baixa.

Nestes casos, é mais importante ter uma avaliação qualitativa, onde se avalie a criança de uma forma mais funcional. O profissional que avalia deve entender conceitos sobre o desenvolvimento infantil para a partir daí compreender melhor os desvios apresentados. Assim, o profissional consegue oferecer estratégias que de fato podem beneficiar aquela criança.

Os testes de triagem são ideais para rastreio de crianças que apresentam algum sinal de desvio. Eles são de rápida aplicação e apontam sinais de que aquela criança apresenta um desenvolvimento atípico em determinada área. A partir daí pode-se encaminhá-la para a avaliação de um especialista.

 

10. Que repercussão no desenvolvimento tem as experiências negativas e dolorosas?

Há diversos estudos sendo conduzidos que apontam alterações que podem ocorrer, principalmente nas áreas de linguagem e aprendizagem futura.
É importante reiterar a necessidade de prover proteção de ambientes nocivos para a criança, o que inclui ambientes com alta vulnerabilidade e violência, por exemplo.

No caso de ambientes hospitalares, é preciso cuidar para a redução de estímulos dolorosos, luzes, sons, etc. Mesmo em ambientes hospitalares é possível criar técnicas para minimizar isso.

Lembrar que a criança ainda não possui recursos linguísticos para expressar seus sentimentos, que muitas vezes são interpretados como “birra” pelos familiares. Quando a família responde à esses estímulos de uma forma agressiva, não se dá parâmetro para que a criança entenda o que está realmente acontecendo e aprenda a lidar com seus sentimentos. A compreensão destes mecanismos pode ajudar a família a lidar melhor com o desenvolvimento da criança.

 

11. É recomendável a técnica de Shantala para o bebê relaxar?
Qualquer recurso ou técnica que se utilize, tem indicações específicas. Algumas crianças são muito irritáveis. É importante que, antes de prescrever um tratamento, o profissional de saúde entenda o motivo dessa irritação, o que causa tamanho desconforto nela. A partir daí consegue-se fazer uma orientação individualizada e com critério.

 

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