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Principais Questões sobre Triagem Auditiva Neonatal em Maternidades

15 jul 2021

Encontro com as Especialistas Renata Pires Rodrigues, fonoaudióloga do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), e Maria Auxiliadora Gomes, médica e pesquisadora do IFF/Fiocruz, realizado em 09/02/2021. 

  • O momento da triagem auditiva é um dos componentes da triagem neonatal do Programa de Triagem Auditiva Neonatal (TAN) no Brasil e é, também, uma das estratégias para o cuidado integral da criança no período neonatal e que refletem no seu processo de crescimento e desenvolvimento. 
  • Espera-se que a TAN seja garantida em todas as maternidades brasileiras, independente do porte dessas maternidades, se de alto risco ou de risco habitual.
  • Idealmente, a triagem neonatal deve garantir a realização da triagem auditiva neonatal. Entretanto, quando não é possível a realização do teste da orelhinha, no âmbito da maternidade, é importante que a maternidade ou outro ponto de apoio/referência para essa criança/família garantam que esse teste seja realizado o mais breve possível.
  • A Triagem Neonatal funciona como uma intervenção precoce, capaz de minimizar os impactos negativos da deficiência auditiva no desenvolvimento infantil.
  • Para uma intervenção precoce é necessário um diagnóstico precoce, a fim de evitar que essa criança tenha, por exemplo, privação da linguagem, de modo que ela possa desenvolver plenamente a sua linguagem e o desenvolvimento cognitivo social, e tenha reduzidas as dificuldades de aprendizagem, por exemplo. 
  • Intervenções precoces favorecem a inserção social da criança e futuramente (na vida adulta) sua inserção no mercado de trabalho e sua plena autonomia e cidadania.
  • De acordo com o IBGE (2012) a prevalência da deficiência auditiva no Brasil era de 5,1% da população, ou seja 9 milhões de pessoas apresentavam algum grau de perda auditiva em 2012. Quando trata-se de recém-nascidos (RN) a prevalência de perda auditiva vai de 30 casos para 10.000 RN. Especificamente para os recém nascidos que ficam internados em UTI neonatal essa prevalência sobe para 100 – 400 casos por 10.000 RN.
  • Diante desse cenário, viu-se a importância da realização da triagem auditiva neonatal, uma vez que a surdez era mais prevalente do que doenças como Fenilcetonúria e Hiperplasia Adrenal, doenças já triadas através do teste do Pezinho. 
  • A indicação é que se faça triagem universal, ou seja, até mesmo crianças que não apresentam nenhum fator de risco para problemas auditivos precisam passar por Triagem Auditiva Neonatal.
  • Avanços no Brasil: Lei Federal 12.303/2010 que obriga a realização do exame de Emissões Otoacústicas Evocadas (EOAE) em todos os recém nascidos. Em 2012 o Ministério da Saúde produz as diretrizes para a Triagem Auditiva Neonatal que, dentre outras atribuições, especifica quando, em que idade e onde deve ser feita a TAN. 
  • De acordo com as diretrizes brasileiras a TAN deve ser realizada ainda na Maternidade com reteste no primeiro mês de vida, caso o primeiro exame tenha alterações no resultado.
  • As crianças que não passam pela TAN na maternidade devem ser referenciada até os 3 meses de vida para a realização do exame. Ele deve ser feito em Serviço de Alta Complexidade, caso alterações auditivas no resultado, ou mesmo perda auditiva, essa criança deve ser encaminhada para Centro Especializado de Reabilitação Auditiva, para que sejam realizadas as devidas intervenções. 
  • Nos casos de alterações auditivas, a intervenção pode ser a seleção e adaptação de aparelho de amplificação sonora individual ou indicação de cirurgia de implante coclear e, adaptação do implante, concomitante com a terapia fonoaudiológica de linguagem.
  • De 2008 a 2019 houve um aumento de 33,4% na cobertura da TAN nas maternidades públicas brasileiras. Em 2008 a cobertura era de 7,7% enquanto em 2018 a cobertura foi de 34,4% e em 2019 (dados até junho) a cobertura era de 33,4% (Rodrigues, 2020).
  • A pesquisa aponta que, quando se compara a cobertura entre as regiões brasileiras, observa-se desigualdades no ritmo de implantação da TAN no Sistema Único de Saúde. A Região Sul apresenta uma implantação da TAN no SUS mais avançada quando comparada às demais regiões do país. A Região Nordeste teve um crescimento expressivo quando comparada às demais regiões do país, em 2008 (3,8%) e em 2018 (25,9%), houve nessa região uma aproximação da média nacional que em 2018 era de 34,4% . A região Norte teve um crescimento na implantação da TAN no SUS, mas em 2014 teve um declínio no ritmo de crescimento dessa implantação, chegando em 2018 a 21,9% de implantação. Na Região Norte houve um aumento significativo na taxa de TAN, sendo que em 2008 era de 6,9% e em 2018 era de 21,9%, ainda assim é a região com menos avanços, somente 33% das maternidades dessa região tinha o programa de triagem auditiva completamente implantado, no momento da pesquisa. Na Região Nordeste houve um aumento significativo na taxa de TAN, sendo que em 2008 era de 3,8% e em 2018 era de 25,9% e somente 50% das maternidades dessa região tinha o programa de triagem auditiva plenamente implantado. A Região Centro Oeste apresentou taxa de implantação de TAN em 2008 de 11,2% e em 2018 de 43% e com o maior percentual de maternidades com o programa plenamente implantado, 77% das maternidades. A Região Sul apresentou taxa de implantação de TAN em 2008 de 11,2% e em 2018 de 69,4%, com 71% das suas maternidades com o programa de triagem auditiva neonatal plenamente implantado. A Região Sudeste apresentou taxa de implantação de TAN em 2008 de 9,7% e em 2018 de 31,4%, com 69,9% % das suas maternidades com o programa de triagem auditiva neonatal plenamente implantado.

 

Desafios para a Implantação do TAN no SUS

  • Apesar das taxas de cobertura da TAN estarem ascendendo, precisa-se avançar mais para atingir a meta de 95-100% de cobertura. Em 2018 ⅔ dos bebês não passaram por triagem auditiva.
  • A falta de equipamentos tecnológicos e a falta de recursos humanos são os principais desafios colocados para a cobertura universal do TAN.
  • Ainda não há consenso entre os profissionais de saúde auditiva sobre os critérios de casos que se considera que “passam ou falham” na triagem auditiva neonatal.
  • Algumas estratégias para a melhoria da cobertura da TAN e da sua qualidade nas maternidades brasileiras são: criação de um banco de dados nacional com informações sobre testes realizados, resultados e outras informações necessárias para acompanhamento e planejamento de ações, adequação do quantitativo de recursos humanos, físicos e tecnológicos para a realização do TAN universal e treinamento/capacitação continuada para os profissionais. 
  • Também torna-se imprescindível a definição de parâmetros dos casos que “passam ou falham” no exame de EOAE para que possam ser usados por todos os profissionais em território nacional. 

 

Abaixo a gravação na íntegra.

 

Perguntas & Respostas 

1. Os indicadores de risco para deficiência auditiva geram entre si prioridade maior na hora de regular o exame de BERA. Os indicadores geram orientações sobre prioridades? 

Os indicadores de risco não tem uma ordem de hierarquia, mas funcionam como um parâmetro de qual exame deve ser utilizado naquele bebê. 

Caso a criança apresente alguns dos indicadores de risco, ela já deve ser submetida ao exame de Potencial Evocado Auditivo Automático (do BERA triagem). Caso não tenha indicador de risco, a criança deverá ser triada pelo exame de Otoacústicas Evocada. No entanto, vale ressaltar que não existe critério de hierarquia entre um indicador e outro.

 

2. Quando a triagem não ocorre na maternidade, como se deve proceder?

É importante entender porque a triagem não foi realizada. Se a maternidade realiza a triagem, mas no dia da alta, o bebê não foi triado, a maternidade deve se responsabilizar pelo retorno da criança para que a mesma realize a triagem auditiva no próprio ambulatório da maternidade. Caso a maternidade não realize a triagem auditiva, a criança deve ser encaminhada para um local que realize o exame. 

A rotina sobre a realização da triagem auditiva deve estar clara para o profissional responsável pela alta da criança. O fluxo deve estar bem estabelecido e estruturado com a Atenção Primária e outros pontos de atenção para que seja garantido o acesso do recém nascido à TAN. 

 

3. É preciso inserir a informação sobre a triagem auditiva durante o pré-natal, assim como o Teste do Pezinho? 

Sim. É importante informar aos pais sobre a triagem neonatal, para que os mesmos possam cobrar na maternidade. É importante que essa orientação também esteja presente na Atenção Primária, uma vez que a atenção primária realiza o pré-natal, a puericultura, etc.

 

4. Mesmo que a TAN tenha um resultado normal (satisfatório) quais os sinais/sintomas auditivos podem estar presentes, caso haja alguma alteração? 

Isso pode acontecer. Mesmo o TAN tendo um resultado satisfatório no momento do nascimento, com o passar do tempo, a criança pode apresentar alterações, perdas auditivas progressivas por outras causas ou outras infecções posteriores. 

Profissionais e pais devem estar atentos a história de surdez na família, se o bebe não se assusta, não acorda com som alto, se a criança não procura fonte sonora e se o bebê não se acalma ao ouvir a voz da mãe. Esses são indicativos de que a criança não está escutando bem. Nesses casos, a criança deve ser encaminhada para uma avaliação pormenorizada, mesmo que tenha passado pela triagem auditiva neonatal. 

 

5. Em caso de alguma alteração na triagem auditiva neonatal, quais os encaminhamentos necessários? 

Precisa-se avaliar. Se o bebê não tinha indicador de risco e se foi triado pelo exame de otoemissões com alterações no resultado, essa criança precisa ser testada novamente, com o exame de Potencial Auditivo Evocado Automático. 

Se a criança já tinha fator de risco e realizou o Potencial Evocado Auditivo Automático e seu exame foi alterado, deve-se repetir o Potencial Evocado Auditivo Automático em outro momento. Se novamente o resultado apresentar alterações, essa criança precisa ser encaminhada para um Centro de Testagem Especializado de Saúde Auditiva. 

 

6. Em algumas realidades assistenciais os recém nascidos comparecem às Unidades Básicas de Saúde sem a realização da Triagem Auditiva Neonatal. Quais os desafios presentes na prática dos serviços de saúde que favorecem essa realidade de não realização da TAN por algumas maternidades brasileiras? 

Os desafios são muitos, mas o que mais chama a atenção é a falta de estrutura para fazer a TAN e/ou fazer a TAN em todos os recém nascidos, ou seja fazer no maior número de dias da semana, ter profissionais disponíveis para fazer de modo a favorecer uma cobertura universal. Algumas maternidades conseguem fazer o exame, mas não conseguem realizar a triagem de todos os bebês, então alguns bebês podem chegar às suas consultas de rotina na Atenção Primária sem ter realizado a triagem, ou até mesmo com alguma alteração percebida pelos pais, por exemplo. 

 

7. Como superar os problemas que envolvem a não cobertura universal se nem mesmo um Programa/Política Pública conseguiu superar este desafio? 

Para a superação desse problema é importante o envolvimento das famílias, de parlamentares, da sociedade civil e de profissionais da saúde. A superação passa também pela divulgação da informação de qualidade e esclarecimento da importância do exame para as crianças e seus desenvolvimento. 

A compreensão de que a triagem e cuidado precoce é menos oneroso do que não triar, é muito importante também. O impacto financeiro para ajustar ou amenizar o problema de crianças que tem problemas auditivos, mas que descobrem tardiamente, é muito grande para Saúde Pública, para a sociedade e para as famílias. O impacto pessoal para a pessoa surda é imenso, uma vez que ela apresenta dificuldade para entrar no mercado de trabalho, para socializar e exercer outras atividades diárias, por exemplo. 

Os marcos legais são importantes, mas eles não são suficientes para a Políticas Públicas serem colocadas em prática. É importante o envolvimento da sociedade como um todo. O Brasil é muito diverso, com maternidades com diferentes dinâmicas, mas é necessário que pelo menos as maternidades maiores sejam referências para que possamos avançar para o apoio de maternidades menores e com menos estrutura e para a cobertura universal da TAN.

 

8. Como a APS pode contribuir no acompanhamento das crianças que necessitam passar por reavaliações periódicas? Existe alguma rotina a ser implementada? 

Todas as crianças, após o nascimento, tem o direito de seguir seu acompanhamento na Atenção Primária à Saúde. Nesse nível de atenção a criança é acompanhada pela equipe de saúde da família, composta por Enfermeiro, Médico, Técnico de Enfermagem e Agentes Comunitários de Saúde. Essa equipe deve estar atenta ao desenvolvimento auditivo, da fala e da linguagem. Caso haja qualquer déficit nesse desenvolvimento, a criança deve ser monitorada/acompanhada e ter o seu cuidado compartilhado com um especialista da área para uma avaliação auditiva completa. 

 

9. O reteste da triagem Auditiva neonatal deve ser realizada em todos os bebês ou somente naqueles que o primeiro teste apresentou alterações? 

A triagem por Emissão Otoacústica deve ser realizada em todos os bebês e o reteste, com Emissão Otoacústica deve ser realizado somente naqueles que tiveram alterações no primeiro exame. 

Caso o reteste tenha resultado alterado, deve-se realizar a triagem com o Potencial Evocado Auditivo Automático (BERA).

 

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