Sintetizamos as principais questões abordadas no dia 09/08/2023 durante Encontro com os Especialistas Marcos Dias, médico obstetra, docente do Programa de Pós-graduação em Saúde da Mulher do IFF/Fiocruz; Carolina Krieger, enfermeira da Associação Brasileira de Enfermagem de Família e Comunidade (ABEFACO); e Melanie Noel Maia, médica de família e comunidade, docente do Departamento de Medicina em Atenção Primária à Saúde da Faculdade de Medicina da UFRJ.
O cuidado pré-natal adequado tem como pressuposto básico a oferta de cuidados individualizados e respeitosos, centrados nas necessidades de cada gestante, durante os diferentes momentos de contato. Isso envolve a implementação de práticas clínicas comprovadamente eficazes, a disponibilização oportuna de informações relevantes, o apoio psicossocial e emocional prestado por profissionais com sólida capacidade clínica e habilidades interpessoais, dentro do contexto de um sistema de saúde eficiente.
A Organização Mundial da Saúde lançou em 2016 um guia com 49 recomendações para uma experiência positiva no cuidado pré-natal. Esse guia leva em consideração o desejo das mulheres de vivenciar uma gravidez saudável para elas e seus bebês, prevenindo riscos à saúde e mortalidade, promovendo a normalidade física e sociocultural durante a gestação e respeitando suas crenças culturais e conhecimentos. O objetivo é facilitar a transição eficaz para o trabalho de parto e parto positivos, proporcionando uma experiência de maternidade positiva, na qual a mulher se sinta competente, autônoma e uma cidadã plena no momento do parto.
No Brasil, o Caderno da Atenção Básica para o Pré-Natal é o documento que estabelece diretrizes importantes para a assistência pré-natal na atenção primária. Ele inclui 10 etapas, desde o início precoce do cuidado na gestação até a garantia dos recursos físicos materiais que são necessários para a atenção pré-natal, a realização e o resultado dos exames em tempo oportuno, a necessidade de escuta da gestante, de seus acompanhantes, incluindo aspectos emocionais, sociais e culturais, e não somente a visão biomédica do cuidado pré-natal.
A seguir serão destacados alguns aspectos importantes e dos documentos mencionados acima, em relação ao cuidado na primeira metade da gestação.
Sistema de referência e contrarreferência
Primeira abordagem ao dar o diagnóstico de gravidez
Preenchimento do cartão pré-natal
O cartão pré-natal, devidamente preenchido com clareza, é de extrema importância para que outros profissionais de saúde possam compreender as decisões tomadas durante a gestação, caso a gestante o apresente em outra unidade de saúde. Isso evita confusões e desafios na compreensão do histórico da gestação. É fundamental que as mulheres sejam orientadas a mantenham esse cartão sempre em mãos.
Qualidade da consulta pré-natal
A pesquisa “Nascer no Brasil” (2012) revelou que o pré-natal no país é universal, com 98,7% das mulheres recebendo algum tipo de assistência pré-natal. Dessas, quase 76% iniciaram o pré-natal antes da décima sexta semana de gestação, e 73% tiveram pelo menos seis consultas de pré-natal. A maioria desses cuidados foi fornecido em unidades de saúde pública, principalmente por médicos. Além disso, 96% das mulheres receberam um cartão de pré-natal.
No entanto, o estudo mostrou que apenas um quarto das mulheres recebeu um cuidado adequado, de acordo com as diretrizes recomendadas. Portanto, há uma necessidade premente de melhorar a qualidade dos serviços de pré-natal, garantindo que todas as etapas sejam seguidas de acordo com os padrões estabelecidos.
A Organização Mundial da Saúde recomenda um mínimo de oito consultas pré-natais. Embora esta atualmente não seja a diretriz do Ministério da Saúde, as evidências indicam que esses oito contatos, não apenas consultas, favorecem o encontro e o entendimento entre a mulher e o profissional. Esses contatos podem funcionar como encontros individuais, consultas em grupo e oferecer espaço para que a mulher possa expressar preocupações específicas. Vale ressaltar que obstetrizes, enfermeiras obstétricas e parteiras são profissionais capacitadas para a prestação dos cuidados pré-natais.
Aspectos nutricionais
No início da gestação, é recomendado orientar as gestantes quanto à alimentação saudável e a evitarem ganho de peso excessivo. É importante ajudá-las a encontrar opções saudáveis dentro do contexto econômico, social e de hábitos individuais.
A suplementação oral diária de ferro e ácido fólico também é recomendada para prevenir anemia materna, baixo peso ao nascer e parto prematuro. O hemograma completo é o método recomendado para diagnosticar anemia na gravidez.
Outras questões importantes a serem abordadas incluem o uso presente ou passado do tabaco, álcool e outras substâncias.
Exames pré-natais
Os exames pré-natais de rotina incluem hemograma, tipagem sanguínea e Rh, coombs indireto para casos de gestantes com Rh negativo, glicemia em jejum, teste rápido para triagem de sífilis (VDRL ou RPR), teste rápido para o HIV, sorologia para toxoplasmose, Hepatite B (HBsAg), urina e urinocultura, ultrassonografia obstétrica e citopatológico.
A ultrassonografia precoce, antes de 24 semanas, é recomendada para avaliação morfológica precoce.
A cultura de urina é o método recomendado para diagnosticar infecções urinárias na gravidez. Ao diagnosticar uma infecção bacteriana assintomática, é crucial adotar um regime de antibióticos por um período de sete dias para o tratamento.
Além disso, o aconselhamento para o HIV e sífilis são abordagens importantes, pois envolvem hábitos sexuais e de autocuidado. Em áreas com alta prevalência de tuberculose, é recomendado conversar sobre a tuberculose e realizar triagem para gestantes.
Imunização na gestação
É essencial abordar o desafio da baixa adesão à vacinação, especialmente contra a COVID-19 e influenza, enfatizando a importância da imunização e a gravidade dessas doenças neste período.
Além destas, gestantes devem atualizar o calendário vacinal com a vacina da Hepatite B (caso não possuam) e anti-tetânica.
Essas são algumas recomendações gerais. No entanto, os profissionais devem conhecer as recomendações completas para uma melhor abordagem às mulheres no pré-natal. Questões como investigação de violências, capacidade de autocuidado e autogestão da saúde, condições de risco socioeconômicos e culturais, manejo dos principais desconfortos – entre outros – não devem ser esquecidas.
Além disso, não se deve subestimar o valor das Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) no cuidado às gestantes. Abordagens como a auriculoterapia e meditação, que não são farmacológicas, desempenham um papel significativo no bem-estar tanto das gestantes quanto de suas famílias e devem ser consideradas como parte do cuidado.
Perguntas & Respostas
Como citar
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira. Portal de Boas Práticas em Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente. Postagens: Principais Questões sobre Cuidado Pré-natal na Primeira Metade da Gestação. Rio de Janeiro, 13 jun. 2024. Disponível em: <https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/atencao-crianca/principais-questoes-cuidado-pre-natal-gestacao-1/>.