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Principais Questões sobre Cuidado Pré-natal na Segunda Metade da Gestação

10 jul 2024

Sistematizamos as principais questões abordadas durante o Encontro com Especialistas Carla Polido, médica obstetra do Departamento de Medicina da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar); Carolina Krieger, enfermeira da Associação Brasileira de Enfermagem de Família e Comunidade (ABEFACO); e Mariana Brandão Streit, médica de família e comunidade, ginecologista e obstetra do IFF/Fiocruz.

O cuidado pré-natal tem como objetivo realizar o rastreamento em uma população geralmente saudável, estimando que mais de 80% das gestantes são saudáveis. Por meio do cuidado pré-natal, é possível detectar sinais precoces de agravos ou fatores de risco, intervindo de maneira apropriada para assegurar os melhores resultados. Essa fase representa uma grande oportunidade para a prevenção, educação em saúde, planejamento reprodutivo e identificação de vulnerabilidades em populações específicas.

No contexto brasileiro, é fundamental abordar a prevenção da morbidade e mortalidade materna, considerando a ainda alta taxa de mortalidade perinatal no país. É durante o pré-natal que se pode rastrear e manejar as complicações, prevenindo que evoluam para situações que coloquem a vida da gestante e do bebê em risco. Além disso, destaca-se a importância do planejamento reprodutivo, com alternativas como o DIU pós-placentário ou pós-parto para prevenir gravidezes não planejadas.

Rastreando e prevenindo fatores de risco para hemorragia, hipertensão e infecções no pré-natal

  • Um fator de risco para hemorragia pós-parto a ser identificado e tratado no pré-natal é a anemia materna. O nível de hemoglobina considerado normal para a gestação é >11mg/dl, sendo necessário tratamento quando se apresenta abaixo desse parâmetro. Para níveis de hemoglobina abaixo de 8mg/dl, deve-se encaminhar para acompanhamento em pré-natal de alto risco.
  • A hipertensão gestacional é particularmente importante na segunda metade da gravidez, uma vez que a maior morbimortalidade está relacionada à pré-eclâmpsia, ocorrendo tipicamente após 20 semanas de gestação. É importante que a medida da pressão arterial seja realizada em todas as consultas pré-natais, com a técnica adequada e com equipamento calibrado. Também é importante mobilizar a equipe de saúde para combater o absenteísmo no pré-natal.
  • O pré-natalista deve esclarecer sintomas relacionados às alterações pressóricas, às alterações fisiológicas da gestação, bem como checar a adesão às medidas terapêuticas. Além do exame geral e obstétrico, é importante monitorizar o edema e ganho de peso entre as consultas. O edema não faz parte do critério diagnóstico, mas é um sinal de alerta para aumento da pressão arterial.
  • O critério diagnóstico para hipertensão são duas aferições com a pressão sistólica maior ou igual a 140mmHg ou a pressão diastólica maior ou igual a 90mmHg, com intervalo de 4 horas entre as aferições. Não é correto fazer a segunda medida apenas na próxima consulta pré-natal para fechar o diagnóstico. Se a pressão arterial sistólica for maior ou igual a 160mmHg ou a diastólica maior ou igual a 110mmHg, está caracterizada uma emergência hipertensiva, e a gestante precisa ser encaminhada para um hospital de referência.
  • Para prevenção das complicações decorrentes de infecção, uma questão a ser enfrentada é o abortamento inseguro, podendo resultar em hemorragia e sepse. Além da questão da descriminalização do aborto, não podemos perder a janela de oportunidade para discutir contracepção durante o pré-natal e orientar sobre a possibilidade de inserção de DIU pós-parto, bem como a oferta de métodos contraceptivos antes da alta da maternidade. Além do aborto, o rastreamento de infecções faz parte da rotina do pré-natal, incluindo o tratamento de bacteriúria assintomática e realização de urocultura controle após o término do tratamento de infecção do trato urinário.

Orientações e exames complementares durante a segunda metade da gestação

  • Os exames complementares que devem ser realizados a partir da 20ª semana de gestação incluem hemograma completo (para rastreio de anemias e infecções), rastreio para diabetes gestacional (glicemia em jejum e TTGO 75g), coombs indireto para gestantes com RH negativo, sorologias para HIV, hepatite B e toxoplasmose (se suscetível), repetição da urocultura e exame de urina e possível pesquisa do streptococcus grupo B, conforme protocolo local – não é realizado de rotina no SUS.
  • O exame de imagem a ser realizado é o ultrassom morfológico entre 20 e 24 semanas. Outros ultrassons obstétricos, conforme necessidade de avaliação de crescimento fetal, devem ser individualizados.
  • Atenção deve ser dada também à imunização: é recomendada a administração da primeira dose da dtpa a partir da 20ª semana, esquema completo da Hepatite B (se não for imune), vacinação contra influenza durante a campanha em qualquer idade gestacional e vacinação contra a COVID-19 também em qualquer idade gestacional.

Durante a segunda metade da gestação também devem ser reforçados os principais sinais de alerta para as complicações mais frequentes:

  •  Edema, cefaléia, alteração visual, dor gástrica.
  •  Diminuição da movimentação fetal.
  •  Qualquer sangramento na segunda metade da gestação.
  •  Contrações rítmicas ou perdas de líquido antes do termo da gestação.

A partir de 37 semanas, as mulheres deverão ser orientadas, em todas as consultas, sobre os sinais de trabalho de parto e o momento de procurar a maternidade, especialmente na presença de contrações rítmicas, com intensidade progressiva, e qualquer perda vaginal de líquido ou sangue.

Elaboração do Plano de Parto

O plano de parto deve ser estimulado, preferencialmente em colaboração com a equipe do pré-natal. Se houver interface com o hospital, é possível incentivar o diálogo com a equipe hospitalar para garantir uma transição suave. Essas orientações visam garantir uma abordagem integral no cuidado pré-natal, individualizando procedimentos conforme a necessidade e promovendo a comunicação eficaz entre as equipes de saúde.

É conhecido que as equipes e as unidades de saúde possuem limitações, porém, há que se encontrar estratégias para que as mulheres sejam bem cuidadas durante este período.

O pré-natal não deve ser exclusivamente conduzido por enfermeiras (os) obstetras, obstetrizes, médicas (os) de família e obstetras. Idealmente, deve-se envolver uma abordagem multiprofissional e interprofissional ao longo de toda a gestação. Destaca-se a tendência mundial do pré-natal em grupo ou pré-natal coletivo, que possibilita explorar o campo de conhecimento entre as próprias gestantes e suas parcerias, proporcionando vínculos e reduzindo o estresse, resultando em benefícios como adequação do ganho de peso, maior adesão ao pré-natal e melhores resultados no pós-parto.

Em resumo, a atenção pré-natal não se limita à ampliação da cobertura, mas requer uma abordagem qualitativa, com ênfase na interpretação clínica, cuidado multiprofissional, pré-natal em grupo e ações preventivas e educativas para garantir melhores resultados para gestantes e seus bebês.

Abaixo, a gravação do Encontro na íntegra.

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Como citar

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira. Portal de Boas Práticas em Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente. Postagens: Principais Questões sobre Cuidado Pré-natal na Segunda Metade da Gestação. Rio de Janeiro, 10 jul. 2024. Disponível em: <https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/atencao-crianca/principais-questoes-cuidado-pre-natal-gestacao-2/>.

Tags: Mortalidade Materna, Posts Principais Questões