Como já é de costume, sistematizamos as principais questões enviadas pelos usuários do Portal durante o Encontro com o Especialista, ocorrido em 22 de março de 2018 com o Dr. Marcos Nakamura, que abordou a importância e utilização da Classificação de Robson em Obstetrícia (veja também a Postagem sobre o assunto).
A Classificação foi criada por Michael Robson no início dos anos 2000, utilizada para monitorar e classificar as cesarianas. Antes dessa classificação utilizavam-se classificações baseadas nas indicações das cesáreas, o que muitas vezes tornava a ação complexa, por, na prática, não haver uma indicação única e específica, mas sim uma composição delas. O diferencial da proposta de Robson é que sua classificação tem como objetivo identificar quem são as mulheres que são submetidas à cesárea. Nesse sentido, existem grupos onde serão identificadas as mulheres. Para o especialista Nakamura, os grupos são homogêneos, com características semelhantes e que em grande parte são determinantes para a indicação de cesárea.
A classificação é baseada em seis itens, a partir de informações que geralmente já são colhidas nos serviços, registradas nos prontuários e importantes à prática clínica. Esses itens são:
A Classificação de Robson tem como grandes vantagens ser totalmente inclusiva e mutuamente exclusiva. Inclusiva pois todas as mulheres atendidas no serviço serão incluídas na classificação, o que é muito importante para as coletas de dados prospectivas. Mutuamente exclusiva pois cada uma das mulheres é classificada somente em um e apenas um dos grupos da classificação. A Classificação de Robson portanto ajuda a responder quem são as mulheres submetidas à cesariana, e portanto se há excessos de cesárea em algum grupo específico.
A classificação por grupos pode ser encontrada na postagem sobre Classificação de Robson.
Assista abaixo ao Encontro na íntegra:
O Encontro com o Especialista é uma webconferência realizada quinzenalmente com especialistas de diversas áreas. Para participar é necessário se inscrever no evento, assim você poderá enviar dúvidas que serão respondidas ao vivo!
Fique atento à agenda de Encontros com o Especialista. Inscreva-se já!
Há um “pacote” de prescrições (itens básicos) baseado na Classificação de Robson? Por exemplo: Robson I a IV = dieta branda ou líquida, SSVV de 6/6 horas, etc.
Não existem recomendações específicas de prescrições segundo grupos de Classificação de Robson. São grupos distintos, onde em um temos mulheres em trabalho de parto espontâneo e em outro mulheres em cesárea eletiva, e nesses casos, por exemplo, o manejo da dieta será diferenciado entre eles.
Sugestões de como sensibilizar equipe médica de maternidade de alto risco?
A utilização dos grupos da Classificação de Robson é muito interessante seja qual for o contexto. Lembrando que em 2015 a OMS recomenda a utilização dos grupos da Classificação de Robson para todas as instituições do mundo, como forma de classificar, monitorar e avaliar as taxas de cesárea de cada instituição. Então mesmo que seja uma maternidade que, por exemplo, só tenha alto risco também é interessante utilizar a classificação, pois assim vai se conseguir avaliar se está tendo alguma mudança do seu perfil da população ou se está acontecendo um eventual aumento de cesárea em um grupo específico.
Um exemplo: uma maternidade de alto risco provavelmente tem uma taxa de prematuros muito mais alta, então suponhamos que esse hospital em janeiro tinha 15% das mulheres no grupo 10 e em dezembro ele encontrou 20%. Esse dado, mesmo sem analisar diretamente a taxa de cesárea, mostra o tamanho dessa população, o que pode fazer o gestor pensar no porque de uma diferença tão grande, de um incremento importante no seu grupo 10. Será que aconteceu algo diferente nessa população? Será que estamos manejando diferente as gestações e não estamos precipitando um pouco as intervenções, e com isso aumentando nosso grupo de prematuros?
Como se dá o uso da Classificação de Robson na equipe com Médico Obstetra e Enfermeiro Obstetra?
A utilização da Classificação de Robson será implementada da mesma forma, tanto em equipes com médicos e enfermeiros obstetras como naquelas só com médicos. Na verdade, há um benefício quando se utiliza a Classificação de Robson em equipes com médicos e enfermeiro obstetra. O gestor poderá olhar o percentual de atendimento do enfermeiro obstetra pelos grupos de Robson, e, dependendo do contexto – se o enfermeiro tem uma atuação direta ou se faz parte de uma equipe multidisciplinar -, analisar , que se for uma atuação direta, espera-se que seja muito mais nos grupos 1 e 3, que tem parto espontâneo. Com isso, o gestor pode avaliar se o percentual de atendimento da instituição nesses grupos está aumentando ou não, ou se está caindo o percentual de atendimento pelo enfermeiro obstetra. Utilizando os critérios de Robson você pode fazer uma análise mais aprofundada, o que é melhor do que fazer uma análise geral. Se em uma maternidade 30% dos partos são com o atendimento por enfermeiro obstetra e posteriormente, em alguns meses, esse percentual cai para 25%, o gestor ficaria sem entender o que está acontecendo. Usando os grupos de Robson pode-se identificar que houve um crescimento do grupo 2, aquele grupo das cesáreas eletivas ou dos partos induzidos, em detrimento do grupo 1 naqueles meses. Com isso, o gestor entenderia o porquê houve essa redução da atuação da enfermagem obstétrica naquele local. Então, utilizar a Classificação de Robson para avaliar algumas práticas e desfechos da gestação é um parâmetro importante, que tem sido incentivado para uso com essa finalidade. Olhar, mesmo os desfechos maternos e perinatais segundo a Classificação de Robson.
Se o serviço não consegue classificar todas as mulheres segundo a Classificação de Robson, há benefícios de iniciar classificando somente aquelas que realizaram cesáreas?
A classificação deve ser utilizada a todas as mulheres atendidas no serviço. Não há um benefício em classificar somente aquelas que realizaram cesáreas. No entanto, se o serviço tem o desejo de iniciar a utilização da Classificação de Robson, mas ainda não tem todas as informações necessárias em seus documentos de registro, a utilização do registro daquelas que realizaram a cesariana pode ser um passo inicial para melhorar o desempenho do sistema de coleta de informações, com vistas a, nos meses subsequentes, utilizar a Classificação de Robson para todas as mulheres atendidas no serviço.
Qual é o momento ideal para fazer essa classificação, na admissão ou pode ser feita pelas anotações pela Declaração de Nascido Vivo?
A classificação não pode ser realizada na admissão da paciente na maternidade, pois ainda não se sabe se ela terá uma cesárea eletiva ou se o bebê será prematuro. Um exemplo, você pode admitir uma paciente com 36 semanas, por alguma complicação clínica, e o bebê vir a nascer somente uma semana depois, com 37 semanas, o que mudaria a mulher de grupo de classificação, deixando de ser do grupo do pré-termo. Da mesma forma, se a mulher foi internada por uma condição clínica e em algum momento houve uma decisão pela cesárea. Então, o melhor momento para fazer a classificação é no momento do parto.Sobre a questão se é possível fazer a Classificação de Robson a partir da Declaração de Nascido Vivo, entende-se que sim é possível, em especial se for a DNV implementada em 2011-2012, pois ela permite a classificação segundo os critérios de Robson. O grande problema é que algumas vezes existe uma incompletude de informação na Declaração de Nascido Vivo com relação ao parto, se foi espontâneo, induzido ou se foi uma cesárea ante-parto. A proposta do Ministério é monitorar as taxas de cesárea utilizando a Classificação de Robson justamente através da DNV.
Ao aplicar a classificação de Robson em um grupo de mulheres, parto gemelar é considerado como parto único ou seja apenas 01 parto
Não, o grupo 8 de Robson é o grupo exclusivo para gestação múltipla. Pode acontecer de ter o parto do primeiro gemelar normal e o segundo, cesárea. A mulher será classificada no grupo 8 como tendo tido cesárea. Uma observação importante com relação à classificação da gestação gemelar, é o caso de mulheres tinham gestação gemelar numa fase inicial da gravidez, no primeiro trimestre e depois um dos bebês veio a falecer dentro do útero; essa gestação vira única a partir de então. Se há um óbito fetal intra útero depois de 20 semanas de gestação, a gestação permanece sendo gemelar; mas se o óbito de um dos fetos for antes de 20 semanas, ela é classificada como gestação única.
Já existe um parâmetro de taxa de cesárea por grupo da classificação? As taxas de cesárea para cada grupo de classificação na realidade brasileira estão disponíveis? Podemos utilizá-la como referência?
Não podemos utilizar como parâmetro de taxa de cesárea os dados que sejam de países desenvolvidos, que são muito fora do nosso contexto. Existe uma publicação que utiliza a classificação de Robson, com base nas informações do Nascer no Brasil, que analisa em separado pelo tipo de pagamento do parto, se público ou privado. Entendo que essa referência pode ser utilizada como parâmetro para as taxas de cesárea nos grupos de Classificação de Robson em nosso país. Na postagem sobre Classificação de Robson aqui no portal, está incluída a referência e o link para o artigo. Ele foi publicado em 2016 na revista Reproductive Health, e o Portal disponibiliza a versão em português.
Como eu poderia utilizar a classificação de Robson na minha instituição com a finalidade de reduzir cesáreas? Como podemos fazer um plano de ação?
Alguns estudos têm um resultado interessante. Apesar de eles não terem sido controlados, ou seja, em termos de qualidade científica ele tem uma informação limitada, eles mostram bons resultados nessa nessa redução de cesárea. Primeiro é necessário preparar a instituição para fazer uma coleta desses dados sobre os grupos de Robson prospectivamente. De tempos em tempos, pré determinados pelos gestores, posso discutir com o grupo de profissionais aqueles resultados. Essa é uma estratégia de auditoria e feedback, na qual audita-se as cesáreas da instituição e a população através dos grupos de Robson e identifica-se ali os grupos que mais contribuem para a taxa de cesárea. A partir disso, dá-se um feedback para os profissionais buscando entender por que a taxa de cesárea do grupo 1 está elevada, discutir com o grupo de profissionais o por quê dos percentuais encontrados em cada grupo. Essas estratégias envolvem reuniões do corpo clínico para tentar identificar as razões, podendo inclusive escrutinar as indicações de cesárea dentro dos grupos de Robson para essa finalidade, e seguir monitorando as taxas através dos grupos de Robson. O feedback para os profissionais pode ser realizado mensalmente ou trimestralmente, dependendo de como está a situação da instituição com relação às taxas de cesárea nos grupos de Robson. O importante é manter uma discussão permanente sobre essas taxas com o corpo clínico. Essa estratégia, mesmo quando utilizada sem outras estratégias que visem a redução de cesáreas, tem se mostrado interessante para o alcance do objetivo de redução na taxa de cesárea, sem ter uma piora nos desfechos. Vale considerar que essa estratégia deve ser permanente! A estratégia tende a funcionar bem nos primeiros ciclos de auditoria, com uma redução naquele primeiro momento, podendo ocorrer uma manutenção das taxas depois de passado os ciclos. Ou ainda, depois de um tempo, pode ser que as taxas de cesárea voltem ao patamar anterior. Então, fica registrado que essa estratégia de feedback demanda um tipo de auditoria permanente para conseguir manter as taxas da sua intervenção, as taxas de interesse (que podem não ser somente a redução de cesárea). Ciclos de Auditoria e Feedback são boas estratégias para reduzir as taxas de cesárea, mas além delas podem ser realizadas intervenções multifacetadas, que são intervenções para grupos específicos. Por exemplo, posso identificar que no grupo de nulíparas, a termo, gestação cefálica, com feto único, e parto induzido, temos muita gestação prolongada e uma taxa de cesárea considerada elevada para este grupo.Então pode ser realizada uma intervenção para melhorar o manejo da indução para este grupo de mulheres, somado aos ciclos de auditoria e feedback. No entanto, os ciclos de auditoria e feedback conseguem ajudar a reduzir as taxas de cesárea, mesmo que o reconhecimento dessa estratégia ainda não seja advindo de estudos clínicos randomizados.
Qual o índice de desfechos desfavoráveis na classificação inicial que utilizam a escala de Robson?
A Classificação de Robson surge para monitorar e avaliar as taxas de cesárea e a proposta de utilizar ciclos de auditoria e de feedback para reduzir cesáreas não apresenta piora no desfecho em nenhum dos estudos publicados até o momento, ou seja, não há piora no desfecho por reduzir cesárea. É importante destacar que os desfechos também podem ser monitorados através da Classificação de Robson, uma proposta que é incentivada também pela Organização Mundial da Saúde. Por exemplo, no grupo 1 – aquele de nulípara, cefálico, feto único, trabalho de parto espontâneo, a termo – poder avaliar a taxa de natimortalidade e de mortalidade neonatal é muito importante, pois nesse grupo espera-se que essas taxas sejam muito baixas. Se no grupo 1 eu encontro taxas elevadas desses desfechos, é algo que deve ser investigado, o porquê dessa ocorrência. É possível monitorar também os desfechos pelos critérios de Robson.
Como mensagem final é preciso destacar que, dentro do contexto das instituições, a principal vantagem da Classificação de Robson é esse monitoramento poder acontecer prospectivamente, permitindo a comparação das taxas de cesárea dentro dos grupos de Robson ao longo do tempo. Além disso, poder comparar também o tamanho dos grupos. Por exemplo, uma instituição pode estar fazendo algum esforço para reduzir a taxa de cesárea e não estar conseguindo. Se ela usa a classificação de Robson é possível entender por quê isso está acontecendo. Por exemplo, pode estar acontecendo que tamanho do meu grupo 5 por acaso aumentou nesse tempo, e nesse grupo – que é o grupo das mulheres com cesárea anterior- a taxa de cesárea esperada é maior. Então pode até ser observado uma redução da cesárea no grupo 1 de Robson, mas com o aumento do tamanho da população do grupo 5, pode não ser observado uma redução da cesárea na instituição, o que seria mais compreensível.
O interessante da Classificação de Robson é poder analisar as taxas de cesárea dentro dos grupos em uma linha do tempo. Ver as taxas prospectivamente e entender o que está acontecendo, e, através da identificação dos grupos que mais contribuem para as taxas de cesárea na instituição, o gestor, se considerar importante, poder propor ações que reduzam as taxas de cesárea naquele grupo.
Conteúdo relacionado