Sistematizamos as principais questões abordadas durante Encontro com Especialistas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP), Fernanda Spadotto Baptista, médica obstetra, e Rossana Pulcineli Francisco, médica obstetra e professora, também chefe da Divisão de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital Universitário da USP e presidente da Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo (SOGESP), realizado em 27/05/2020. O conteúdo em texto nesta Postagem foi atualizado até a data da postagem, 17/05/2021.
Paramentação e Desparamentação
Passo a passo
Novas evidências científicas sobre COVID-19 podem surgir, esteja atento à data da realização do Encontro ao assistir à gravação. O conteúdo em texto nesta Postagem foi atualizado até a data da postagem, 17/05/2021.
Perguntas & Respostas
1. Tendo em vista os relatos de óbitos de gestantes e puérperas pela COVID no Brasil, existe alguma recomendação mais rigorosa para mulheres no final da gestação?
No final da gravidez considera-se que a mulher já passou por todas as modificações fisiológicas e anatômicas da gestação. Nesse sentido, o organismo da mulher é mais suscetível a evoluir para a forma mais grave da COVID-19, com descompensação respiratória.
As gestantes internadas por COVID-19 até o segundo trimestre podem ser bem manejadas com suporte clínico até que a doença passe. No entanto, as gestantes com mais de 32 ou 33 semanas tem apresentado maior risco de descompensação cardiovascular, sendo necessário muitas vezes antecipar o parto. Nesse sentido, a prematuridade é uma grande preocupação.
Embora haja mais risco no terceiro trimestre, a gestante deve ser considerada grupo de risco em qualquer um dos três trimestres, uma vez que a COVID-19 é uma doença nova e as respostas imunológicas tem sido muito diversas.
A maior recomendação para mulheres no final da gestação é que os profissionais não minimizem os sinais e sintomas apresentados. Deve-se lembrar que a piora clínica pode acontecer no decorrer da doença, não necessariamente no início. Isso significa que alguém que não tem sintoma nenhum ou que está com poucos sintomas pode agravar.
2. O que deve ser orientado para gestantes sobre sinais e sintomas de alerta e em que momento devem procurar os serviços especializados?
Algumas vezes é difícil a mulher saber que sua oxigenação baixou, então ela deve ser orientada que se tiver falta de ar, mesmo que seja pouca, ela deve procurar o hospital. Isso vale também para gestantes que apresentam febre persistente e tosse importante.
É importante que os profissionais não avaliem somente a frequência respiratória nas gestantes com suspeita ou confirmação de COVID-19. Gestantes que estão no terceiro trimestre costumam apresentar alteração maior da frequência respiratória, no entanto, mulheres no começo da gestação podem ter frequência respiratória normal e saturação e saturação de oxigênio alterada.
Outro ponto importante é que os serviços se organizem para fazer ligações telefônicas para seguir acompanhando o estado de saúde e a evolução da COVID-19 na gestante, se ela está melhor ou pior.
3. O que pode ser feito para garantir o atendimento pré-natal durante a pandemia?
Interromper os atendimentos de pré-natal durante a pandemia é muito preocupante. O pré-natal é essencial e não pode ser postergado, já que não realizá-lo implica em outros riscos. O pré-natal serve para identificar riscos e prevenir morte materna por outras causas que não COVID.
Uma estratégia importante que deve ser considerada é a reorganização dos fluxos, separando as unidades de saúde que fazem atendimento de pacientes com COVID-19 das unidades que fazem o pré-natal das gestantes. Lembrando que o pré-natal não acaba quando o bebê nasce, e tanto a mulher quanto o bebê devem retornar à atenção primária após o parto.
Principais Questões sobre COVID-19 e Gestação: Atenção Pré-Natal e em Maternidades
4. Quais são as orientações a respeito do Método Canguru?
Cada unidade vai se organizar da forma que for possível, dentro da sua realidade, tentando garantir a melhor assistência e o vínculo entre o bebê e sua família.
Recomenda-se fazer uma triagem, perguntando para a mulher todas as vezes que ela for à unidade para fazer o método canguru, se ela apresenta algum dos sintomas da COVID-19. Além disso, deve-se aferir sua temperatura.
As mulheres com suspeita ou confirmação de COVID-19 devem aguardar a resolução da doença antes de voltar a ter contato com o bebê, uma vez que é possível que o recém-nascido seja contaminado.
Nessas situações, é possível buscar por estratégias que possam aproximar as mães e famílias dos bebês, como realizar vídeo chamadas. É importante buscar a humanização na assistência, mas sem perder os desafios impostos pela pandemia.
Recomendações para o Método Canguru Durante a Pandemia de COVID-19
5. Se não há disponibilidade de UTI na unidade, em que momento a mulher com suspeita de COVID-19 deve ser transferida e quais os cuidados neste transporte?
Se uma gestante com COVID-19 está precisando de cateter de O2, o ideal é que ela seja transferida neste momento para uma unidade que tenha suporte de leitos de UTI.
A piora das gestantes quando não estão respondendo bem ao cateter de O2, é muito rápida, em questão de horas. Por isso orienta-se que, se a gestante precisa de cateter de O2 para manter a saturação acima de 93%, deve-se buscar transferi-la para uma unidade com leitos de terapia intensiva, caso ela precise de intubação.
Quanto ao cuidado no transporte, deve-se atentar para a disponibilidade de oxigênio, a fim de garantir que haja insumo suficiente até que a transferência seja concluída.
6. Todas as gestantes devem ser orientadas a amamentar de máscara? Suspeitas e não suspeitas?
Se a mulher for assintomática e não houver nenhuma suspeita de COVID-19, ela pode amamentar sem máscara.
Em situações que a mulher tem suspeita ou confirmação de COVID-19, deve-se lembrar que, além dos cuidados de higiene da mama, alguém deve trazer a criança para mãe amamentar. Além disso, a mãe precisa estar de máscara o tempo inteiro e ela deve ser orientada a tentar controlar a sua tosse enquanto amamenta.
7. Como treinar toda a equipe sobre paramentação?
Independente da pandemia , é importante que as unidades mantenham constante treinamento sobre paramentação e desparamentação. Pode-se dar aulas, organizar vídeos e colocar postagens nos sistemas de intranet.
Além disso, é importante realizar treinamento individual, onde o profissional descreve o que está fazendo, passo a passo. Quando ele erra o procedimento, alguém avisa e ele inicia tudo novamente. Após a paramentação, o profissional simula um atendimento, descreve como está se desparamentando e sai. Toda a equipe deve se vigiar quanto aos cuidados e procedimentos, a fim de aumentar a proteção. Os hábitos vão se perdendo então é preciso se cuidar e relembrar com frequência.
8. A gestante com alto risco, diabetes, hipertensão, cardiopatia e que tenha COVID-19 confirmado ou suspeita, é possível manejo no domicílio ou é recomendado que ela seja internada?
Se a gestante tem síndrome respiratória e indicação para internação, independente de comorbidade associada, ela tem que ser internada. Há situações em que a gestante pode permanecer em casa, com sintomas leves. Mas se há indicação de internar, isso não pode ser postergado.
Também pode acontecer de a gestante ter sintoma respiratório leve, ter COVID-19 positivo e ter indicação de internar por causa da patologia clínica associada à gestação. É importante lembrar que ter o vírus não muda a boa prática da medicina.
Prevenção da Mortalidade Materna por Hipertensão
9. Considerando que muitas pessoas infectadas pela COVID-19 não apresentam sintomas ou sintomas leves, o que pode ser feito para dar mais segurança nessa triagem?
Não há um método rápido e ideal para essa triagem, então é importante organizá-la de forma a garantir a maior segurança possível para as mulheres e as equipes.
Mesmo na presença de sintomas leves, deve-se considerar a possibilidade de COVID-19 e organizar toda a estrutura e os fluxos para proteger a gestante e seu bebê. Recomenda-se que os profissionais troquem a paramentação, bem como realizar a limpeza terminal da sala, reduzindo os riscos de contaminação de outras pacientes.
A paciente assintomática tem a probabilidade de transmissão muito baixa, porque não está tossindo ou espirrando. Ainda assim, o ideal é que todo mundo use máscara.
10. Recomenda-se o monitoramento contínuo da frequência cardíaca fetal, com cardiotocografia, durante o trabalho de parto?
A alteração da cardiotocografia em gestantes com COVID-19 está relacionada à oxigenação dessa paciente. Nesse sentido, o risco de alterações é maior de acordo com o estado geral da paciente. Por exemplo, uma paciente em trabalho de parto, com COVID-19, que está com o cateter de O2 merece cardiotocografia contínua. Já uma gestante de risco habitual, positiva para COVID-19 mas assintomática ou que esteja saturando bem, pode-se fazer monitoramento intermitente. É importante avaliar a gravidade do quadro para recomendar ou não a cardiotocografia contínua.
Avaliação do bem-estar fetal intraparto
11. Como garantir nas maternidades públicas e privadas a manutenção das boas práticas na assistência do parto no contexto atual?
É importante considerar o momento epidemiológico da pandemia e a realidade de cada instituição. Nesse sentido, é necessário que cada unidade faça essa avaliação e busque alternativas para que o melhor cuidado seja ofertado para cada mulher e bebê.
Ainda que não seja possível garantir a presença do acompanhante no alojamento conjunto e enfermarias coletivas devido ao aumento no risco de contaminação, não se deve aumentar a indicação de cesarianas desnecessárias, por exemplo.
Deve-se garantir a manutenção de analgesia não-farmacológica e farmacológica para alívio da dor, as indicações de via de parto baseadas na melhor evidência e, sempre que possível, o acompanhante, pelo menos no momento do nascimento. Pode-se buscar alternativas, com ajuda da tecnologia, para tentar aproximar familiares, puérperas e bebês, através do uso de vídeos e fotos. Essas estratégias geram tranquilidade para os pais e familiares.
12. A gestante com 12 semanas gestacional evoluindo com ausência de cheiro, sabor e febre, qual a conduta?
A perda do olfato, paladar e febre, são sintomas muito característicos de COVID-19. Há grandes chances dessa paciente estar com COVID-19. Ao apresentar febre, considera-se também síndrome gripal associada. Em paciente gestante, sem critérios de internação, e febre de um ou dois dias sem persistência, deve ser bem orientada e acompanhada em casa.
13. A cada coleta ou exame, é necessário higienizar a sala para entrada de uma nova paciente? Elas tem reclamado da demora do atendimento.
A sala para atendimento de pacientes assintomáticas não precisa ser higienizada a cada atendimento. No entanto, para pacientes com suspeita de COVID-19 ou COVID-19 confirmado, a limpeza terminal é necessária.
O grande desafio é quebrar a cadeia de transmissão da COVID-19. Muitas pessoas estão preocupadas com a transmissão por gotículas e aerossóis e acabam se esquecendo do risco de contaminação pelo contato, encostando em local ou objeto contaminado e depois se contaminando. Por isso é importante proceder à limpeza terminal depois de cada atendimento. Para agilizar o tempo de limpeza, recomenda-se deixar o mínimo possível de objetos na sala.
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