Portal de Boas Práticas em Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente

Postagens

Principais Questões sobre Doença Hemolítica Perinatal

29 abr 2022

Sistematizamos as principais questões abordadas durante Encontro com as Especialistas do IFF/Fiocruz Augusta Assumpção, médica ginecologista e obstetra, e Marcella Vasconcelos, médica hematologista e hemoterapeuta, realizado em 05/09/2019. Veja também: Postagem sobre o tema

A Doença Hemolítica Perinatal (DHPN) é caracterizada pela destruição das hemácias fetais por anticorpos maternos, que são produzidos a partir do primeiro estímulo em uma gestação anterior ou transfusão anterior à gestação em curso. Na gestação anterior a mulher produz os anticorpos, e na gestação seguinte passa os anticorpos pela barreira placentária para o feto, uma vez que este apresenta nas suas hemácias antígenos diferentes dos antígenos da mãe, que são os antígenos que a criança herdou do pai.

A Doença Hemolítica pode ter várias causas, mas a mais comum é o anticorpo anti-D, quando a mãe é RH negativa e o feto é RH positivo, nesse caso a mãe produz anticorpos contra as hemácias positivas.

A Doença Hemolítica também pode ocorrer por incompatibilidade no sistema ABO, podendo ser comum, principalmente quando a mãe é O e o bebe é A ou B, com menos repercussões quando comparada a anemia fetal.

A Doença Hemolítica depende da prevalência do Fenótipo D negativo na população. No Brasil a prevalência é de aproximadamente 10%.

Causas da hemorragia feto materna associadas a aloimunização

  • Abortamento;
  • Gravidez ectópica e aborto espontâneo (também relacionadas a procedimentos como aminiocentese);
  • Parto e outros sangramentos ao longo da gravidez.

Atenção:

  • 50% dos casos de doença hemolítica são leves, ou seja, não necessitam de tratamento.
  • 25% dos casos vão ter, anemia moderada,  icterícia, sem hidropsia.
  • 25 % são casos graves de hidropsia fetal, com necessidade de  intervenção no período intrauterino.

A incompatibilidade ABO entre mãe e feto, reduz o risco de aloimunização ANTI-D pois as hemácias ABO incompatíveis são retiradas precocemente da circulação.

Durante o pré-natal é importante investigar: se a mulher é Rh negativo, se a mulher tem histórico de transfusão prévia ou procedimento fetal anterior, histórico de traumatismo ou cirurgia anterior, histórico de compartilhamento de seringa, mulheres com história de doença hemolítica na gestação anterior, mulheres com histórico de aborto e multíparas.

Do ponto de vista dos exames é importante atentar para: identificação ABO/Rh do pai e da mãe. A partir da 24ª semana de gestação, se Coombs negativo repetir a cada 4 semanas e se Coombs positivo referenciar para maternidade de alto risco. 

Opções terapêuticas

Antes do nascimento: transfusão intrauterina (TIU). A TIU é indicada quando há uma anemia grave fetal e deve ser feita até a 34ª semana de gestação, e espera-se como resultado uma hemoglobina maior que 10 g/dl. Após a TIU é realizado acompanhamento por ultrassonografia e avaliação sobre necessidade de novas transfusões.

Após o nascimento: fototerapia, exsanguineotransfusão e a transfusão simples. O acompanhamento pós natal é realizado através de alguns exames: ABO, Rh, TAD (coombs direto – teste da antiglobulina direta, bilirrubinas e hematócrito).

Os recém-nascidos devem ser acompanhados semanalmente para avaliação dos exames e cerca de 75% deles recebem transfusões durante o acompanhamento. 

O acompanhamento a longo prazo é feito através dos seguintes exames: HB/hematócrito, reticulócitos, TAD, pesquisa de anticorpos irregulares.

Medidas de prevenção: imunoglobulina anti-RhD. Deve ser utilizada em todas as gestantes Rh negativa mães de crianças Rh positiva em até 72 horas após o parto, casos de abortamento espontâneo ou terapêutico, ameaça de abortamento com sangramento, doença trofoblástica gestacional, gravidez ectópica, investigação fetal invasiva.

Alguns protocolos recomendam profilaxia na 28ª semana. Podem ocorrer falhas na profilaxia quando existem variantes do sistema Rh, hemorragia materna grande ou não quantificada.

A Aloimunização RhD e a DHPN devem ser consideradas pelos gestores e profissionais de saúde que trabalham com gestantes como evento sentinela, pois refletem a qualidade da assistência nos serviços de saúde e as condições de saúde da população.

Abaixo, gravação do Encontro na íntegra.

Perguntas & Respostas

1. Qual a diferença da Doença Hemolítica Perinatal e a incompatibilidade ABO? As condições dos casos são diferentes?

A Doença Hemolítica Perinatal pode ser causada pela incompatibilidade do sistema ABO, mas em geral quando a mãe é O e o bebe é A ou B. 

Existem algumas diferenças entre as duas situações. A incompatibilidade ABO é mais branda, pode ocorrer na primeira gestação, raramente necessita de exsanguineotransfusão, geralmente apenas fototerapia resolve a problemática. A doença hemolítica perinatal por Anti-D é uma doença mais grave, sendo mais comum na segunda gestação e pode estar associada a outras comorbidades como anemia grave, trombopatia, icterícia no pós-parto e quando não tratada pode evoluir para hidropisia.

 

2. A Doença Hemolítica Perinatal pode ocorrer na primeira gestação?

O mais frequente é o acometimento a partir da segunda gestação, mas existem algumas situações especiais como, por exemplo, a mãe achar que é a primeira gravidez desconhecendo os possíveis abortos anteriores. Outras situações são a transfusão incompatível e doença hemolítica por ABO que pode ocorrer na primeira gestação.  

É importante ressaltar que não há acometimento da doença hemolítica por ABO na fase intrauterina, por ser causada por anticorpos que por terem um alto peso molecular e que não passam pela barreira placentária.

 

3. O diagnóstico pode ser feito na Atenção Primária à Saúde? O que os profissionais devem estar atentos?

Na primeira consulta de pré-natal na APS deve-se solicitar a tipagem sanguínea ABO e o fator Rh. 

De acordo com o protocolo do Ministério da Saúde, se a gestante for Rh negativo deve ser solicitado o exame coombs indireto. Caso este exame tenha como resultado coombs indireto positivo, essa gestante deve ser encaminhada para o pré-natal de alto risco para seguir com a investigação e intervenções pertinentes ao caso. Portanto, sim, a Atenção Primária, deve fazer essa triagem/rastreio para que as gestantes que tenham indicação sejam adequadamente e em tempo oportuno encaminhadas para outros níveis de atenção

 

4. Existe prevenção da Doença Hemolítica Perinatal? Como ela é feita?

Sim. A prevenção é realizada através da administração da Imunoglobulina ant-RhD que deve ser aplicada até 72 horas pós-parto, em caso de abortamento ou em qualquer procedimento durante a gestação. 

Essa imunoglobulina deve ser aplicada quando a mãe é Rh negativa, não é sensibilizada (coombs indireto negativo) e o bebe é Rh positivo, para evitar que a mãe forme anticorpos que irão atacar as células do sangue do próximo filho, sendo necessário, nesse caso, a imunoprofilaxia.  

Caso a gestante seja aloimunizada por outros anticorpos, e tenha coombs indireto positivo, ela pode receber a profilaxia para que não forme o Anti-D, além do anticorpo que ela já tem.

 

5. A suspeita de doença hemolítica perinatal exige pré-natal de alto risco?

Sim. Recomenda-se que todos os casos que tenham a suspeita de doença hemolítica perinatal sejam encaminhados para pré-natal de alto risco. Assim, tem-se condição de analisar se existe a doença hemolítica e fazer um acompanhamento mais adequado para gestante, a fim de que seu bebê possa nascer em melhores condições.

 

6. Como deve ser o acompanhamento pós-natal da mãe e do bebe? Por quanto tempo ele deve ser feito?

No acompanhamento pós-natal da criança, exames laboratoriais devem ser solicitados (hemoglobina, hematócrito, coombs direto e indireto, bilirrubina e reticulócito, geralmente semanalmente) para avaliar a anemia e a existência de anticorpo circulante (o coombs direto deve ficar mais fraco, com o passar do tempo, e o grau de hemólise deve diminuir). 

É importante ficar sempre atento à necessidade de transfusão.  Para o acompanhamento da mãe é recomendado planejamento familiar, se essa mulher ainda estiver em fase reprodutiva e desejar ter outras gestações.  

Mulheres não aloimunizadas, ou seja, com Rh negativo é indicado a imunoprofilaxia, para as mulheres que já estão sensibilizadas não há o que fazer, apenas o aconselhamento para cuidados com as futuras gestações.

 

7. Pacientes D-fraco vocês estão fazendo imunoglobulina? A dose é a mesma?

Só é possível definir D fraco a partir da biologia molecular. Em alguns tipos de D fraco pode-se formar ant-D.  De acordo com a literatura, no D fraco tipo 1, 2 e 3 está autorizado a não fazer imunoglobulina, pois não vão formar ant-D, os demais tipos de D fraco e as outras variantes D deve-se fazer imunoglobulina, pois há um risco de formar anticorpo. 

Na maioria dos serviços não há o diagnóstico molecular disponível. Assim, se é D fraco faz-se a imunoglobulina com a mesma dose, porém se estiver disponível o diagnóstico molecular e é um D fraco tipo 1, 2 e 3 não há necessidade de fazer imunoglobulina.

 

Como citar

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira. Portal de Boas Práticas em Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente. Postagens: Principais Questões sobre Doença Hemolítica Perinatal. Rio de Janeiro, 29 abr. 2022. Disponível em: <https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/atencao-mulher/principais-questoes-sobre-doenca-hemolitica-perinatal/>.

Tags: Posts Principais Questões