Sistematizamos as principais questões abordadas no Encontro com a Especialista Carla Andreucci Polido, médica obstetra do Departamento de Medicina da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), realizado em 09/07/2020.
TOTG 75g/resultado | ||
Diabetes Mellitus | Diabetes Gestacional | Diabetes Pré-gestacional (DM2) |
Jejum: ≥ 92 mg/dl | Jejum: glicemia ≤ 92 e < 126 mg/dl | Jejum: glicemia ≥ 126 mg/dl |
1h: ≥ 180 mg/dl | ——– | ——– |
2h: ≥ 153 mg/dl | 2h: glicemia < 200 mg/dl | 2h: glicemia ≥ 200 mg/dl |
TOTG 75g/resultado | ||
Diabetes Mellitus | Diabetes Gestacional | Diabetes Pré-gestacional (DM2) |
Jejum: ≥ 92 mg/dl | Jejum: glicemia ≤ 92 e < 126 mg/dl | Jejum: glicemia ≥ 126 mg/dl |
1h: ≥ 180 mg/dl | ——– | ——– |
2h: ≥ 153 mg/dl | 2h: glicemia < 200 mg/dl | 2h: glicemia ≥ 200 mg/dl |
Abaixo, gravação do encontro na íntegra.
Perguntas & Respostas
1. Quais os cuidados básicos que se deve ter com a gestante?
A captação precoce da gestante, a vinculação da gestante e de sua família com a equipe de saúde, uma atenção ao pré-natal de qualidade com anamnese/história clínica, exame físico, diagnósticos possíveis durante a gravidez, plano terapêutico bem traçado, uso de exames laboratoriais para rastreamento e complementação da avaliação clínica do profissional são cuidados que os profissionais devem ter com as gestantes e famílias.
O pré-natal não é restrito à solicitação de exames protocolares. A gestação envolve expectativas da mulher ou do casal, medos e angústias que devem ser trabalhadas durante as consultas. A avaliação da saúde mental da mulher é importante para o preparo de uma maternidade mais tranquila. As consultas de pré-natal devem ser espaços oportunísticos, pois podem ser um dos poucos momentos que a mulher acessa o serviço de saúde. Assim, é importante atentar também para a saúde da mulher, não somente para a gestação em si.
2. Deve-se mudar alguma coisa no pré-natal durante a pandemia?
Sim. Durante a pandemia é importante manter os cuidados para a prevenção da infecção pela Covid-19. O treinamento de toda a equipe de saúde e dos profissionais que trabalham nas instituições de saúde, sejam elas Unidades Básicas de Saúde, ambulatórios ou hospitais, é fundamental para a segurança da gestante.
É imprescindível dar continuidade ao pré-natal. A interrupção no acompanhamento das gestantes traz mais malefícios do que benefícios, visto que o não acompanhamento com o pré-natal aumenta consideravelmente a possibilidade de desfechos maternos e neonatais negativos, associados à não adesão ao pré-natal pelo isolamento social. A equipe precisa ser protegida e treinada, as gestantes precisam ser protegidas, mas o acompanhamento do pré-natal não deve cessar. A utilização de recursos virtuais (consulta virtual, chats, entre outros) podem ajudar em algumas situações.
3. Como a caderneta de gestante pode contribuir para a qualificação do pré-natal?
A caderneta da gestante é uma forma de documentar as informações relevantes encontradas durante as consultas (pressão arterial, peso, uso de medicações, diagnósticos). É um documento onde devem estar inseridas todas as informações sobre o que tem sido avaliado durante as consultas de pré-natal.
A qualidade das informações e o preenchimento correto pelo profissional assistente é de fundamental importância para o manejo dessa gestante em outros serviços de saúde. Por exemplo, uma gestante acompanhada em uma Unidade Básica de Saúde e que acessa o serviço de uma emergência deve ter na sua caderneta os exames solicitados, diagnósticos, intercorrências para que os profissionais da emergência consigam fazer as intervenções necessárias e evitar as intervenções desnecessárias.
Além disso, a Caderneta é um documento que possui informações educativas para a gestante e sua família (alimentação, amamentação, medidas de prevenção, orientação sobre imunização, entre outros).
4. A sorologia para Citomegalovírus não deve ser solicitada como rastreio?
A sorologia para citomegalovírus nunca foi uma rotina no Brasil. Esse exame pode ser solicitado em situações específicas, para realizar diagnóstico diferencial, em que haja suspeita de infecção viral ou quadro febril não especificado. Alguns protocolos para as consultas/acompanhamento da pré-concepção recomendam a solicitação da sorologia como um rastreamento, mas durante o pré-natal de risco habitual não é uma rotina no Brasil.
5. Sou enfermeiro da Estratégia de Saúde da Família, em um município de 10 mil habitantes. Temos muitas dificuldades em conseguir a ultrassonografia obstétrica para as gestantes em tempo hábil. Alguma medida pode ser sugerida para esse problema? Diante dessa dificuldade de acesso a esse exame de imagem, deve-se priorizar algum caso? Se sim, quais casos deveriam ser priorizados?
Nesse contexto apresentado, caso não seja possível solicitar a ecografia obstétrica para as gestantes, uma estratégia seria a equipe avaliar quais os casos de maior risco.
A datação da idade gestacional é importante de ser pesquisada, por exemplo. Nos casos em que a mulher tem dúvidas a respeito da última menstruação ou não tem informações suficientes para a equipe calcular a idade gestacional a ecografia obstétrica passa a ser importante. Quando é possível dispor de uma ecografia para cada gestante, é importante que esse exame seja realizado até a 14ª semana de gestação, pois, nesse período é possível fazer uma datação adequada. Verificar gemelaridade e dependendo da qualidade do exame é possível realizar o rastreamento de cromossomopatias. A ultrassonografia que pode ser solicitada até a 24ª semana de gestação ou entre a 24ª e 28ª semana de gestação, a depender do caso, deve ser priorizado para os casos de maior risco (gestantes com hipertensão, diabetes, infecções inespecíficas).
6. Se a mãe for RH-, não se deve solicita também o Coombs indireto?
Sim. O coombs indireto faz parte da pesquisa de anticorpos irregulares. Quando se solicita somente o coombs indireto está se avaliando somente o Anti-D. Portanto, deve-se pesquisar todos os anticorpos irregulares.
Deve-se lembrar que o sistema AB0 também produz anticorpos irregulares, o que desencadearia algumas incompatibilidades. Assim, quando se fala em pesquisa de anticorpos irregulares (PAI), supõe-se que não se refere somente ao anticorpo Anti-D, mas a todos que podem ser produzidos.
7. A Eletroforese de Hemoglobina faz parte, há um tempo, dos exames de rotina do pré-natal. Existem muitos casos de Anemia Falciforme entre as gestantes?
A população brasileira tem na sua conformação étnica/racial um quantitativo considerável de pessoas da raça negra (pretos e pardos) e a Anemia Falciforme é prevalente nessa população. Nesse sentido, é fundamental a realização da eletroforese de hemoglobina como um rastreio no pré-natal das mulheres no Brasil.
Alguns estados e municípios recomendam a realização desse exame em todas as gestantes e em outros a indicação é individualizada. Considerando a miscigenação dos brasileiros é importante o profissional assistente atentar para gestantes negras com histórico de anemia crônica e história familiar de Anemia Falciforme.
8. Qual é a relação entre o pré-natal e a morte materna?
Até o momento, não há evidências fortes sobre como o pré-natal impacta na redução da morte materna. Entretanto, sabe-se que consultas de pré-natal de qualidade tem condições de rastrear as principais condições que levam à morte materna.
No Brasil, a hipertensão (síndromes hipertensivas) é uma das principais causas e pode ser diagnosticada durante o pré-natal, por exemplo. A segunda causa de morte materna são as hemorragias pós-parto, esse quadro não é algo que possa ser prevenido com o pré-natal, mas existem condições como anemias graves que, se bem manejadas durante o pré-natal, podem reduzir consideravelmente o risco de morte dessas mulheres.
Assim, o pré-natal de qualidade pode ajudar com bons desfechos materno-fetais, embora não existam na literatura fortes evidências sobre isso. Em países de baixa e média renda o pré-natal faz diferença na morbimortalidade. Já em países de alta renda, o pré-natal não faz muita diferença, visto que nesses países as mulheres não estão vulnerabilizadas socialmente. A população brasileira não é completamente saudável se considerarmos as questões de vulnerabilidade social.
9. Qual a conduta para a gestante com Citomegalovírus?
A conduta é basicamente o acompanhamento/investigação da infecção fetal, pois não há tratamento durante a gestação.
10. Quais condições sugerem encaminhar uma mulher para o pré-natal de alto risco? Quais resultados podem ser manejados pela atenção primária?
O caderno de manejo da Atenção ao Pré-Natal de Risco Habitual do Ministérios da Saúde (2012), assim como protocolos estabelecidos pelos estados e municípios, contém os casos que devem ser manejados na Atenção Básica e os que devem ser compartilhados com outros níveis de atenção (Atenção Secundária).
Alguns casos como: a anemia moderada/grave; o fator RH –, com pesquisa de anticorpos positiva; a sífilis é variável (tem serviços que a APS trata, tem outros locais que dispõe de ambulatórios específico); a presença de proteinúria na urina I, são situações que justificam um encaminhamento para o pré-natal de alto risco. Entretanto, esses encaminhamentos podem variar com os protocolos e fluxos definidos pelos estados e municípios brasileiros. Em alguns locais a Atenção Básica, antes de fazer os encaminhamentos, lançam mão do matriciamento de especialistas focais (médico obstetra), por exemplo.
11. Quanto à infecção urinária, noto que muitas mulheres são assintomáticas. Alguns artigos apontam que a infecção urinária assintomática não traz influência na prematuridade dos partos. Visto isso, deve-se tratar ou não?
Os profissionais assistentes devem atentar para o fato de que a infecção urinária na gestação possui sintomas atípicos, mas não necessariamente apresenta-se como assintomática.
Muitas mulheres que estão com uma infecção urinária ativa, apresentam como único sintoma a polaciúria. Logo, a forma mais objetiva de o profissional avaliar essa polaciúria é via solicitação de exame de urina. Caso a gestante já apresente outros sintomas, o profissional já deve solicitar os exames Urina Tipo I e Urocultura, mas se for um único sintoma (inespecífico) pode-se iniciar a investigação somente com solicitação do exame Urina Tipo I.
Os sintomas: dor abdominal e polaciúria, por exemplo, são sugestivos fortes de infecção urinária na gestação. Sempre que tiver uma urocultura positiva, mesmo que a gestante esteja assintomática, ela deve ser tratada.
12. Existe um período mais apropriado durante a gestação para coleta de citologia oncótica (citopatologia do colo do útero)?
A literatura aponta que a coleta pode ser realizada em qualquer período da gestação. Entretanto, como no primeiro trimestre as perdas (sangramentos e abortos) são mais comuns, o profissional pode adiar essa coleta para o segundo trimestre. Essa orientação se deve somente para evitar a associação das perdas sanguíneas com a realização da coleta do citopatológico do colo do útero.
É importante o profissional que irá realizar o exame sempre orientar sobre a técnica que irá ser realizada, as possibilidades de pequenos sangramentos e outros desconfortos no momento do exame.
13. Como deve ser a prescrição de Sulfato Ferroso ou Ferro Elementar?
É preciso estar atento à formulação disponível em cada local. Na bula do Sulfato Ferroso tem a quantidade de ferro elementar por comprimido. Para fazer a prescrição correta de ferro elementar é importante fazer a conversão correta, de acordo com a bula do comprimido que está sendo prescrito.
Deve-se lembrar que o ferro provoca desconforto gástrico. Logo, é importante boas orientações para amenizar os efeitos colaterais e favorecer a adesão ao tratamento.
14. Há alguma estratégia de captação precoce das gestantes no pré-natal? Algumas mulheres chegam muito tarde no pré-natal, principalmente as adolescentes.
O bom acolhimento das mulheres e de suas famílias, a busca ativa pelos Agentes Comunitários de Saúde e uma boa cobertura das equipes de Estratégia da Família, ajudam na captação precoce.
Mulheres que acessam os serviços em busca de consultas de rotina devem ser questionadas (com sua privacidade garantida) sobre questões como atraso menstrual e a possibilidade de estar grávida, por exemplo.
Quando há suspeita de uma gravidez em curso, a oferta de teste rápido é de grande valia para o diagnóstico precoce e se possível já realizar consulta com solicitação de exames (Enfermeiros ou Médicos).
15. O exame de streptococcus deve ser colhido como rotina do pré-natal?
Não. No Brasil não é uma recomendação como rotina no pré-natal.
Esse exame deve ser solicitado para rastreamento em situações de risco gestacional. Por exemplo, se uma mulher tem urocultura positiva para Streptococcus, além de ter bacteriúria assintomática pelo Streptococcus, que deve ser tratada no momento do diagnóstico, essa mulher é provavelmente uma portadora maciça de Streptococcus e está eliminando a bactéria na urina. Nesse caso, essa gestante pode ser uma candidata a receber a profilaxia. Realizar ou não a profilaxia para Streptococcus é uma discussão a ser feita, pois não existem evidências fortes de que essa recomendação deva ser universal. Os benefícios da profilaxia ainda não estão estabelecidos, por isso não há indicação de rastreio universal.
Como citar
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira. Portal de Boas Práticas em Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente. Postagens: Principais Questões sobre Exames de Rotina do Pré-Natal. Rio de Janeiro, 11 out. 2021. Disponível em: <https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/atencao-mulher/principais-questoes-sobre-exames-de-rotina-do-pre-natal/>.