Publicado em 13 nov. 2024 | Atualizado em 21 nov. 2025
Sistematizamos e atualizamos as principais questões abordadas durante Encontro com o Especialista Álvaro Luiz Alves, médico obstetra do Hospital Sofia Feldman e Instrutor na Estratégia Zero Morte Materna por Hemorragia (OPAS/OMS/MS), realizado em 19/02/2020.
Hemorragia pós parto é conceituada (2025) por:
Limiar de perda sanguínea objetivamente medido de
≥300 mL com qualquer sinal hemodinâmico anormal (pulso >100 bpm, índice de choque >1, pressão arterial sistólica <100 mmHg ou pressão arterial diastólica <60 mmHg) ou perda sanguínea objetivamente medida de ≥500 mL, o que ocorrer primeiro dentro de 24 horas após o nascimento, e com vigilância especial durante as primeiras 2 horas.
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No mundo, uma mulher perde a vida devido à hemorragia pós-parto a cada 4 minutos. A questão epidemiológica torna-se mais grave ao considerarmos os casos de “near miss“ – situações em que a puérpera enfrenta um quadro hemorrágico sem evoluir para óbito, mas requerendo internação em terapia intensiva e um longo período de recuperação.
Outro dado importante é que aproximadamente 3 em cada 5 mulheres que sofrem uma hemorragia pós-parto recebem cuidados inadequados. Estima-se que 90% dos óbitos poderiam ser prevenidos se houvesse uma atenção médica mais cuidadosa e uma melhor organização da equipe de saúde.
Esses óbitos estão frequentemente relacionados à realização de histerectomias e à perda da chamada “hora de ouro”, que é o período crucial logo após o início do quadro hemorrágico. É nesse momento que o controle do foco da hemorragia é essencial, e a falta desse controle pode levar a complicações graves, como o choque hemorrágico. Infelizmente, muitas vezes a histerectomia é realizada quando a puérpera já está em estado de choque, o que não apenas falha em salvar sua vida, mas também pode agravar a situação e retardar a tomada de decisão.
Há uma relação significativa entre a ocorrência de hemorragia pós-parto, a necessidade de histerectomia e a mortalidade materna. Para reverter esse cenário alarmante, é essencial que os profissionais de saúde melhorem o atendimento, estejam preparados para intervir prontamente e adotem medidas preventivas adequadas. Somente assim é possível impedir tragédias evitáveis e garantir um futuro mais seguro para as mães em todo o mundo.
Além da histerectomia, a hemorragia guarda uma relação estreita com outras intervenções no parto, como a cesariana (pela perda sanguínea esperada ser maior do que a do parto normal), a indução do parto e manobras inadequadas, como a manobra de Kristeller (proscrita, mas ainda realizada em muitos serviços de saúde).
Como prevenção da hemorragia, é preconizada a administração de ocitocina (10 UI, por via intramuscular/intravenosa) em todos os partos. Nos casos de partos por via vaginal onde as pessoas têm acesso IV, a administração intravenosa de 10 UI de ocitocina – diluída e administrada lentamente durante 1 a 2 minutos – é recomendada em vez da administração IM.
Outra questão importante é a vigilância nas maternidades. As primeiras duas horas pós parto são um período de risco aumentado para hemorragia, devendo-se estar vigilante quanto à quantidade de sangramento, involução uterina e sinais vitais. Ainda que o conceito da hemorragia considere as primeiras 24 horas pós parto, cerca de 90% dos casos acontecem imediatamente após o nascimento.
Em termos de prevenção, a prática com maior evidência de sucesso é o uso da ocitocina, mas existem outras também importantes, como o clampeamento oportuno do cordão umbilical (entre 1 e 3 minutos), a tração controlada do cordão (que diminui o tempo de dequitação) e o contato pele a pele com a mãe (aquece e libera ocitocina endógena).
Uma vez que a hemorragia acontece, são 4 grandes grupos de causas hemorrágicas, conhecidas pelo mnemônico “4 Ts”: tônus, trauma, tecido e trombina.
A causa mais frequente é relacionada ao tônus (em torno de 70% das hemorragias); a segunda mais frequente é trauma (que são os traumas vulvoperineais, lacerações vaginais ou no colo uterino, mas também a rotura uterina e a inversão uterina); a terceira causa é relacionada a tecidos (retenções de material ovular, cotilédones placentários ou membrana placentária, com grande relação com a epidemia de cesarianas) e a quarta causa menos frequente é a trombina (que são as coagulopatias).
Em termos de tratamento, é necessária uma abordagem multiprofissional rápida e eficiente, com controle do foco hemorrágico dentro da hora de ouro. É essencial que a equipe multiprofissional seja organizada, com um líder que possa pedir ajuda e coordenar as ações. O indivíduo que lidera a equipe ou outra pessoa integrante deve inicialmente executar a manobra de Hamilton, na qual se comprime o segmento anterior no segmento posterior, obstruindo as duas artérias uterinas que são responsáveis por 90% do suprimento de sangue; enquanto a manobra está sendo feita para controlar a hemorragia, o restante da equipe precisa dar prosseguimento às outras ações.
Manobra de Hamilton
No segmento das drogas, o acido tranexâmico deve ser administrado concomitantemente à ocitocina (1a. escolha), e pode ser repetido dentro de 30 minutos, e mais uma vez se houver recidiva dentro das 24h. No caso de falha da ocitocina, a dose de manutenção deve ser mantida, mas iniciar a segunda droga – a metilergometrina – na dose de 0,2 mg via intramuscular, que também pode ser repetido dentro de 15 a 20 minutos. A terceira droga é a prostaglandina, como o misoprostol e, em caso de falha, haverá indicação de intervenção cirúrgica (balão intrauterino para mulheres pós-parto normal e, em caso de cesariana, além do balão, pode-se utilizar as suturas uterinas compressivas ou as ligaduras vasculares).
A histerectomia aparece como opção final diante das falhas de todas as outras técnicas, lembrando que a mesma deve ser feita de preferência dentro da hora de ouro ou pouco após a primeira hora da hemorragia.
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FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira. Portal de Boas Práticas em Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente. Postagens: Principais Questões sobre Intervenções Oportunas na Hemorragia Obstétrica. Rio de Janeiro, 21 nov. 2025. Disponível em: <https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/atencao-mulher/principais-questoes-sobre-intervencoes-oportunas-na-hemorragia-obstetrica>.