Sistematizamos as principais questões sobre o leite ideal para o recém-nascido pré-termo e a transição da sonda para o peito, tema do Encontro com as Especialistas Eremita Val Rafael (UFMA) e Andrea Fernandes (BLH/SP), realizado em 19/07/2018.
Neste encontro as especialistas reafirmam que o alimento ideal para recém-nascidos pré-termo é o leite da própria mãe, que deve ser iniciado o mais precoce possível visando diminuir as perdas de proteína endógena, promover a progressão mais rápida da dieta, um menor tempo de nutrição parenteral, a retirada mais rápida de cateteres centrais e um menor risco de sepse tardia, minimizar as perdas ponderais iniciais e promover um crescimento harmônico dos prematuros.
As especialistas também discorrem sobre a melhor alternativa na impossibilidade de oferta do leite da própria mãe, que é o leite humano pasteurizado do banco de leite considerando as necessidades e características do receptor.
Finalmente, abordam as técnicas disponíveis para favorecer a transição da alimentação por sonda para seio materno e garantir um aleitamento exclusivo para este grupo de bebês.
Abaixo, trecho da gravação do Encontro, que também está disponível na íntegra.
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1. Gostaria de saber se há algum estudo ou evidência do prematuro em aleitamento materno exclusivo com o ganho de peso inadequado.
Hoje temos muita evidência científica a favor do leite da mãe para o próprio filho. Em todos os continentes, isso é uma unanimidade; a Sociedade Europeia de Pediatria preconiza o leite da própria mãe, a América do Norte preconiza o leite da própria mãe; o Ministério da Saúde preconiza o leite da própria mãe. Então, é muita evidência científica para alguém falar o contrário. O leite da mãe para o próprio filho é unanimidade; na ausência dessa possibilidade nós vamos usar o leite de banco e, em última instância, a fórmula se não houver alguma dessas alternativas anteriores.
2. Qual é a fixação correta da sonda e quando ocorre a transição?
Não há evidência de que uma forma de fixação da sonda seja melhor que a outra, ambas possuem vantagens e desvantagens. Nós, consultores do Método Canguru, optamos pela sonda de três pontas porque ela libera a boca do bebê para a sucção. Por isso essa é a fixação de sonda ideal para a transição do aleitamento materno. Vamos lembrar sempre que a fixação é na articulação temporomandibular; às vezes as pessoas colocam na bochecha e isso será muito nocivo porque vai atrapalhar a sucção do bebê.
3. Gostaria de saber sobre o protocolo de transição da sonda para a mama em unidade neonatal.
As unidades neonatais podem desenvolver os seus protocolos ou podem tomar como base o Manual Técnico do Método Canguru. O caminhar consiste em sonda, mama vazia, translactação, relactação e o uso do copinho somente na ausência da mãe.
4. Nossa unidade neonatal realiza a coleta de leite à beira do leito, pois acreditamos melhorar a humanização. O BLH acredita que, primeiro, devem-se ocorrer mudanças como: fazer funcionar o canguru, o contato pele a pele, o livre acesso dos pais, pois, quando o pai entra, a mãe precisa sair. Qual é a sua opinião?
O contato pele a pele é fundamental e essencial para a melhora do aleitamento materno; pai e mãe têm garantia de acesso livre (os dois) pela Portaria MS nº 930 de 10 de maio de 2012.
Quanto à ordenha à beira do leito, não é preciso estar num mundo perfeito para começar esta coleta. É claro que tudo isso que você relacionou na sua pergunta é extremamente importante (o Método Canguru, a presença dos pais dentro da unidade neonatal, a proximidade da família na unidade neonatal), lembrando também que esse contato pele a pele, mãe e bebê, ajuda a formação do microbioma. O bebê precisa ter o microbioma saudável e não é o contato com o profissional de saúde que vai proporcionar isso. Ele precisa de contato com a família dele, que traz as bactérias do domicílio, as bactérias que são boas, as bactérias que vão entrar em competição com as bactérias da UTI que levam à sepse tardia.
Outro aspecto é sobre o sistema bronco entero-mamário dessa mulher que, na presença dessa unidade neonatal, vai transmitir anticorpos contra aquele microbioma presente na unidade que pode translocar e causar infecção para o filho dela. Então é muito importante a presença do pai e da mãe; isso não se discute mais e há muita evidência científica falando a esse favor. O movimento de melhora da humanização dentro da unidade neonatal é extremamente importante e deve continuar.
Concomitante a isso, mudar a prática e tentar fazer a coleta à beira do leito. Sabemos que é difícil e que precisamos sensibilizar a equipe, mas hoje temos uma norma técnica com todos os procedimentos bem detalhados, mantendo a segurança alimentar. É necessário que o setor de Controle de Infecção Hospitalar atue em conjunto, porque, às vezes, existe o receio de que isso possa aumentar a infecção, mas sabemos que isso não acontece.
É preciso seguir os parâmetros, as indicações e as orientações para segurança alimentar à beira do leito. Isso é de extrema importância porque, além de ter o leite da própria mãe, os trabalhos já mostram que essa mulher, olhando para o filho dela, consegue produzir mais leite do que quando tirado o leite na sala do banco.
Quanto a ela poder tirar o leite na presença de pai ou não, na presença de outros homens, de outros profissionais, isso dependerá de cada mulher. Há mulheres que não se sentirão confortáveis para fazer a extração do leite à beira do leito; outras acharão que isso não tem nada demais; mas se a sua unidade já pratica isso, se já é algo comum para todos os profissionais, com certeza, cada vez mais, as mães se sentirão confortáveis para fazer a extração à beira do leito.
5. Infelizmente, estamos discordando no momento de fazer a coleta à beira do leito na UTI neonatal, pois a equipe quer iniciar a coleta, mas está sem espaço para uma caixa isotérmica para ser enviado o excedente do leite para o BLH. O BLH não concorda em desprezar o leite excedente da coleta na UTI neonatal. Qual é a sua opinião? Até o momento as mães usam o BLH, enviam o leite para a unidade neonatal e o excedente é armazenado para a pasteurização.
Ao mudar uma rotina, podemos encontrar algumas dificuldades para que o resultado seja exatamente o que pretendemos. Conseguir fazer a coleta à beira do leito já é maravilhoso. A partir do momento em que a equipe se sensibiliza, que for verificada a evolução favorável que essa criança e sua família estão tendo, provavelmente se conseguirá um espaço para a caixa isotérmica. Esse transporte está escrito na norma técnica da rBLH Brasil, Rede Global de Bancos de Leite Humano e precisa ser feito em cadeia de frio, então você tem toda razão de querer uma caixa isotérmica. Se nesse momento, você não consegue retirar o excedente à beira do leito e mantê-lo na cadeia de frio, então retire o que o bebê necessita, mantendo a segurança alimentar, ofereça à criança, e a mãe esvazia a mama lá no banco de leite, nesse primeiro momento. Assim que adquirirem a caixa térmica, passa-se a fazer a extração completa da mama à beira do leito e a levar o excedente em cadeia de frio para ser acondicionado adequadamente.
6. Quanto ao uso de aditivos fortificantes no leite materno, como proceder? O leite materno fornecido antes da nutrição plena é necessário receber o fortificante?
O leite da mãe para o prematuro é muito importante e deve ser preconizado porque ela produz o leite com as qualidades que o bebê precisa. Se for usar o leite de banco, quando não se consegue o leite da mãe para o próprio filho (até ela começar a produção), respeitar as necessidades desse receptor.
Por exemplo, que leite escolher para um recém-nascido que já está em recuperação nutricional? Optar por um leite de idade gestacional homóloga. A acidez do leite deve ser menor ou igual a 4 para que se possa disponibilizar cálcio e fósforo e evitar osteopenia da prematuridade.
Quanto dar de caloria e de proteína para esse bebê? Precisamos fornecer um leite acima de 700 cal/litro. A oferta hídrica que supre necessidades desse receptor prematuro, completada com nutrição enteral plena, deve ficar em torno de 200 ml/kg/dia. Usando toda essa tecnologia (o banco de leite, a manutenção do prematuro, o leite da mãe para o próprio filho), provavelmente você não vai precisar usar aditivo. Não significa que somos contra aditivo ou que nunca usamos o aditivo, mas você só vai abrir mão do aditivo se todas essas orientações foram seguidas para esse bebê. Muitas vezes, começamos a usar aditivo sem utilizar todas as tecnologias disponíveis, tanto no banco de leite quanto o leite da própria mãe; e esse aditivo não é inócuo, ele vai alterar a osmolaridade do leite e aumentar o risco de enterocolite. Quando necessário, só começar a usar o aditivo quando a oferta hídrica estiver maior do que 100 ml/kg/dia, numa fase mais posterior quando o bebê tiver maior estabilidade. Mas, na maioria das vezes, respeitando a necessidade do receptor e as características desse leite humano, você não vai precisar usar aditivo na sua unidade.
7. A rotina de realizar a contenção das mãos dos bebês para evitar a retirada da sonda impacta negativamente sobre o estímulo da sucção? Qual é a opinião de vocês sobre isso?
Prender as mãos do bebê realmente impacta negativamente no estímulo da sucção, porque o bebê já está nos indicando que quer mamar e, por medo de acharmos que ele não tem idade ou peso, prendemos as mãos dele com luvinhas e ataduras. Isso é desaconselhável, pois é nocivo para o bebê por estarmos impedindo o seu desenvolvimento normal com os seus estímulos se manifestando (ele quer sugar a mão, quer puxar a sonda) e indicando que quer mamar no peito.
8. No caso, por exemplo, de termos um recém-nascido pré-termo com 29 semanas, 900 gramas e outro com 31 semanas e 1,800 kg, qual o melhor critério para escolha do leite humano ordenhado ou pasteurizado?
Esta escolha depende das condições clínicas desse bebê. Em qualquer um dos casos, se o bebê acabou de chegar à UTI, queremos iniciar uma dieta trófica e a mãe dele não conseguiu fazer a extração do colostro deve-se prescrever o leite de banco. Lembrar que o leite com crematócrito mais baixo tem mais fatores de proteção; então, numa nutrição trófica, para um bebê pré-termo cujo intestino apresenta uma peristalse lenta, com vilosidades ainda não formadas, uma baixa produção das enzimas (lactase) e, em algumas vezes, até ausente, será necessário ofertar um leite que tenha os prebióticos que favoreçam a absorção desse alimento e fazer também a microbiota dessa criança. Neste caso não se deve oferecer um leite com muito carboidrato, proteína e gordura. O ideal é oferecer um leite hipocalórico nesse início da dieta trófica, com acidez menor ou igual a 4. Na unidade neonatal, principalmente na unidade de terapia intensiva neonatal, onde as crianças apresentam maior gravidade e instabilidade, especialmente para prematuros extremos ou abaixo de 32-34 semanas, usar somente o leite com acidez menor ou igual a 4, independente se ele está em recuperação nutricional ou se ele ainda está numa nutrição trófica. Quando pudermos começar a aumentar o volume de leite, aumentar as calorias como se fosse um leite de transição. Próximo à nutrição plena, poderemos oferecer um leite hipercalórico sempre liberando a oferta hídrica. Cuidado também, nas unidades neonatais, com o uso de diuréticos, pois falamos tanto sobre a prevenção da osteopenia da prematuridade e ainda usamos diuréticos depois de hemoderivados e isso espolia cálcio e fósforo. Existe um conjunto de condutas que minimizam espoliação sanguínea de cálcio e de fósforo e proporcionar um crescimento mais adequado para esse bebê, juntamente com o leite que ele precisa para aquela fase. Desta forma, a resposta é que não existe uma receita fixa para cada bebê. Devemos interpretar a clínica, a fase, o quadro clínico da criança e oferecer o que temos de melhor no nosso banco de leite (na ausência do leite da própria mãe), que é o leite humano pasteurizado que respeite as características do seu receptor.
9. Qual o critério vocês utilizam para iniciar a transição para via oral num recém-nascido pré-termo?
Durante anos utilizamos critérios como 1,5 – 1,6 kg e 34 semanas; mas hoje consideramos dois critérios básicos: estabilidade clínica e prontidão do bebê para sugar. Naquele início da técnica da mama vazia, não precisamos não é necessário esperar a prontidão do bebê, porque podemos iniciar no peito da própria mãe. Mas na transição mesmo, quando formos retirar a sonda, aí sim é preciso observar a prontidão do bebê para sugar e a sua estabilidade clínica. Também nesta situação, não existe uma receita; muitas unidades se prendem ao critério peso, mas este não significa desenvolvimento. Às vezes um bebê com 31 semanas e 1,800 kg era colocado no peito, sem se considerar a idade gestacional, mas apenas o seu peso. Se formos considerar algo, será o desenvolvimento. Se um bebê não desenvolvido for colocado no peito, ele pode ser mais lento e não retirar a quantidade de leite necessária para a sua nutrição e, consequentemente, perder peso.
10. No caso de bebês broncodisplásicos ou com alterações respiratórias importantes e que a mãe não possui leite suficiente para amamentar devido ao tempo prolongado de internação, como vocês conduzem a transição sonda/via oral?
Às vezes nos prendemos muito à questão da oxigenação do bebê e o impedimos de sugar. Contudo, podemos leva-lo para sucção no peito da mãe e observar suas respostas, seguindo a mesma transição (sonda/peito, translactação e relactação). Um bebê broncodisplásico geralmente necessita de maior oferta calórica; para esse bebê é extremamente importante oferecer o leite da própria mãe. Um bebê que apresenta broncodisplasia pulmonar, geralmente necessita de um tempo longo de internação, pode ter passado por falhas de extubação e necessitado de oxigenioterapia por muito tempo. Tudo isso faz com que a história dele na unidade neonatal seja muito estressante, levando à diminuição da produção láctea da mãe. É importante que ela saiba que pode voltar a produzir leite e nós precisamos ajudá-la nesse momento. A técnica da translactação ou relactação, como vocês preferirem, é muito importante nesse momento para ajudar na transição da sonda para o peito da mãe. Devemos sempre preconizar o peito da mãe. Existem milhares de desculpas: quedas da saturação, o bebê que se cansa fácil, mas é preciso reconhecer e saber interpretar o tempo de cada criança. Provavelmente esse bebê broncodisplásico vai se cansar e toda mamada precisa ser monitorada pela equipe, provavelmente ele ficará com oxímetro de pulso por mais tempo devido ao uso da oxigenioterapia; então não trazer ansiedade para a mãe pois assim, por muitas vezes, atrapalhamos o aleitamento materno. Por isso a equipe precisa ser uníssona para falar para a mãe que cada bebê tem o seu ritmo, tem o seu dia de ter alta, tem o seu prazo dentro da unidade neonatal que será olhado individualmente. Essa conversa precisa ser feita e é um dos segredos do sucesso para a gente conseguir dar alta em aleitamento materno para esses bebês.
11. Qual a estabilidade do leite materno ordenhado LMO e LMP, isso já descongelado ou ordenhado, para oferecer ao bebê?
Essa é uma questão muito importante; ao acabar de fazer a extração do leite, o ideal é que ele seja oferecido o mais rápido possível para o bebê. Cada local tem uma temperatura diferente, cada unidade neonatal tem a sua temperatura, então não dá para falar que o leite tem duas ou seis horas de estabilidade. É preciso ter em mente que quem vai receber esse leite é um bebê que está enfermo, dentro da unidade, extremamente vulnerável a todas intempéries. Assim, precisamos que o leite humano, chegue ao bebê com a melhor qualidade possível; chegou leite na unidade, é para ser ofertado; chegou o leite da própria mãe (ela fez a retirada do leite à beira do leito), é para ser ofertado. Muitas vezes é melhor trazer a mãe para perto da gente, colocá-la para ajudar na unidade neonatal, oferecendo o leite para o seu bebê; obviamente com os profissionais de saúde por perto, apoiando isso. Quem melhor para cuidar de um bebê do que a própria mãe? Esse vínculo precisa começar a ser estabelecido na unidade neonatal, com a primeira etapa do método canguru. Às vezes, a gente acaba achando que o bebê é nosso e não deixamos a mãe atuar; mas é preciso enxergar que tudo isso ajuda para que esse leite seja dado mais rapidamente, pois ela mesma vai retirá-lo, vai avisar ao profissional de saúde que ajudará a colocar na gavagem para oferecer ao seu bebê. Trazer pai e mãe para dentro da unidade ajuda tudo isso a acontecer de uma forma mais tranquila e com segurança.
12. Quando se deve iniciar a estimulação oral do recém-nascido pré-termo e quais técnicas podem favorecer a sucção?
Observamos no Brasil inteiro que são utilizadas várias estimulações do recém-nascido, inclusive o excesso de estimulação. Devemos ter muito cuidado com esse excesso, na verdade a primeira experiência oral do recém-nascido deve ser no peito da sua própria mãe. Contudo, existem muitos estudos que falam das vantagens da estimulação da sucção não nutritiva no recém-nascido. Existem, então, duas técnicas: a técnica da sucção não nutritiva (que deve ser acompanhado por fonoaudiólogo) e a técnica da mama vazia (colocar o bebê para experimentar o peito da mãe), que é a que preferimos e aconselhamos à enfermagem, realizar e deixar a técnica da nutrição não nutritiva mais para a fonoaudiologia. A estimulação deve ser iniciada quando o bebê começar a apresentar sinais de prontidão para mamar; não precisa ser tão precoce e nem tardiamente. Isso passa pela questão de individualização do cuidado, respeitando a singularidade do sujeito, pois cada bebê tem a sua reação. Observamos nas unidades neonatais que, quanto mais pré-termo os bebês nascem, mais precocemente conseguem desenvolver as habilidades se comparados aos bebês que nasceram depois de 30 semanas.
Frequentemente colocam a mão na boca do bebê para estimular a e, muitas vezes, acabam provocando o reflexo de náusea e vômito. Assim, um bebê que estava apto a ir para a mama, naquele momento, começa a ter recusa, porque está sendo feito um estímulo em excesso ou de uma forma inadequada. Desta forma, devemos deixar a estimulação oral, a sonda dedo, para a equipe de fonoaudiologia que foi capacitada para isso e vamos abraçar a questão do peito vazio. Vamos esvaziar a mama e colocar o bebê para cheirar, para lamber e, assim, começar a aprender a mamar no peito.
13. Existe alguma diferença prática entre as terminologias “relactação” e “translactação”?
Relactação significa que a mulher não tem leite e então, quando o bebê sugar no peito, irá proporcionar a relactação. É preciso fazer com que a prolactina chegue até aos alvéolos para que haja a produção de leite, e eu faço isso com o leite de outra fonte, que não é o leite da própria mãe. Já a translactação é quando o leite é da própria mulher, mas de alguma forma o bebê não consegue pegar o peito. Como exemplo, temos o bebê que passou muito tempo no tubo orotraqueal e que tem dificuldade, que vai empurrar o mamilo da mãe; nesse caso, faremos a translactação (retirar o leite da própria mãe, colocar no recipiente, colocar no peito). As técnicas são iguais, a diferença é a finalidade e a origem do leite.
14. Para um recém-nascido pré-termo, 30 semanas, que, após a alta da UTIN, está evoluindo com baixo ganho ponderal e está em aleitamento materno exclusivo, qual é a melhor conduta?
Antes de falarmos que ele está com o ganho inadequado e baixo, temos que saber o que significa ganho adequado. O bebê deve ganhar de 14 a 16g/Kg/dia e esse é um ganho ponderal que consideramos ideal. Será que é isso que a sua unidade está considerando como ideal? É ótimo você estar trabalhando com o leite da própria mãe e podemos trabalhar com o leite posterior da mãe também. Será que esse bebê se cansa rápido, ou dorme muito? Será que ele está conseguindo fazer o esvaziamento da mama, retirando realmente o que precisa? Será que ele não tem que ir mais vezes ao seio? Todas essas perguntas nos ajudarão a melhorar a dieta desse bebê e, com certeza, melhorar esse ganho ponderal. Estamos permitindo realmente a livre demanda, ou esse bebê dorme demais e por isso não está conseguindo se alimentar? Geralmente, eles são bastante dorminhocos e talvez todas essas perguntas podem nos ajudar a adequar a oferta de nutrientes para esse bebê, para ele ter um ganho satisfatório.
Como o bebê tem 30 semanas, talvez ele realmente não consiga retirar todo o leite que precisa e então é preciso fazer alguma complementação por meio da translactação (usando esse leite posterior).
15. Como vocês trabalham com a questão do leite posterior no processo de transição da sonda para o peito?
Precisamos ter o cuidado em ofertar o leite posterior para o bebê que já está com determinada idade e peso em que ele precisa do leite posterior para ganhar peso. Nesse caso, fazemos a extração do leite, retiramos o excedente do leite da frente e pegamos o leite do final. Podemos fazer vários arranjos, porque todo leite é importante para o bebê; o leite anterior é rico em imunoglobulinas, o leite intermediário é rico em proteínas e o leite posterior é rico em gordura. Se focarmos somente em um maior ganho ponderal, podemos deixar o bebê frágil, sem proteção; logo devemos permitir que algumas vezes o bebê receba o leite posterior e, em outras, receba o leite intermediário e anterior. Precisamos analisar também qual é a quantidade de leite, porque se dermos muito leite, dificilmente chegaremos ao leite posterior; vamos sempre priorizar para que, com várias mamadas, o bebê receba o leite posterior.
16. Qual é a fixação ideal da sonda nasogástrica? Sobre a administração da dieta enteral, há ou não a necessidade de utilização de luva de procedimento?
Nós, consultores do Método Canguru, recomendamos a fixação na articulação temporomandibular para a liberação da boca do bebê, para que ele faça a sucção. Já sobre a necessidade de utilização de luva de procedimento na administração da dieta enteral, não há justificativa. Primeiramente, luva de procedimento não é estéril, então a mão bem higienizada vai ser mais adequada do que as luvas. Quando uso luvas de procedimento estarei me protegendo, por isso não há necessidade da utilização de luvas na administração da dieta enteral.
17. Como vocês trabalham com bebês que precisam de complemento dentro do processo de transição da sonda ao peito? Como saberemos se o volume de complemento após a oferta do seio materno é o ideal para que não haja regurgitação?
Esta não é uma situação fácil. É preciso acompanhar o bebê, verificando o seu ganho ponderal, a sua evolução, e ir aumentando o volume sempre observando a sua resposta. O refluxo é fisiológico no recém-nascido, principalmente do recém-nascido prematuro; logo, é preciso analisar se o refluxo é patológico ou se é fisiológico. O refluxo fisiológico às vezes nem vê, mas o bebê vai ter um ganho ponderal satisfatório e um sono tranquilo. Já o refluxo patológico igualmente às vezes você o enxerga, e às vezes não, porém haverá irritabilidade extrema, o bebê não dorme, não fica tranquilo no colo da mãe e não ganha peso. Hoje em dia, sabemos que medicação para refluxo tem mais efeitos colaterais do que benefícios e, muitas vezes, o mecanismo de ajuste de peristalse acaba piorando o refluxo. Assim, hoje não usamos medicação antirrefluxo, principalmente na unidade neonatal. Existe, ainda, o risco dessas medicações causarem alterações de ritmo cardíaco; com isso, fazemos as medidas posicionais para esses bebês (elevando o decúbito, mantendo o bebê no canguru por mais tempo possível que a mãe tolerar) e realizar a transição observando a evolução clínica da criança. Por exemplo: hoje vou complementar com 10 ml em cada mamada, a mãe está melhorando a produção láctea, está fazendo a extração desse leite, mas o bebê ainda está um pouco sonolento; no dia seguinte, a criança ainda não está do jeito que queríamos, então vamos aumentar mais um pouco e observar. Esse é o controle fino que precisamos ter, sempre com paciência e sem pressionar a mãe com a questão do ganho de peso para que esse estresse não diminua a sua produção láctea.
Quando estamos nessa transição, o próprio bebê vai dizer que não quer mais; quando ele mama no peito e depois fazemos a técnica da translactação e relactação, o bebê sinaliza quando não quer mais.
18. Uma mãe com anemia falciforme pode amamentar normalmente?
Não há contraindicação em relação à anemia falciforme. Em relação a medicações, uma dica são os portais como o E-lactancia e LactMed, que são muito atuais; você pesquisa o nome da medicação e obtém a compatibilidade com o aleitamento materno; para muitas mulheres contraindicam a amamentação por um equívoco, por uma falta de informação, ou uma informação ultrapassada.
19. O leite ordenhado pela mãe pode ser congelado e depois oferecido para o recém-nascido após o descongelamento, sem pasteurizar?
Esse leite volta para o banco de leite, é pasteurizado, e aí sim será oferecido para o bebê.
20. Vocês relataram cautela para que a unidade não seja dependente de fonoaudiologia devido a grande demanda de pacientes para poucos profissionais. O melhor caso seria o aumento do número de fonoaudiólogo nas unidades neonatais?
Aumentar o número de fonoaudiólogos é uma opção é muito interessante mas vamos lembrar que o aleitamento materno é fisiológico e toda amamentação não pode depender de um fonoaudiólogo. Este profissional é muito valorizado, ele é ouro nas unidades neonatais, mas observamos a mesma situação com o banco de leite: a equipe acaba não sabendo mais lidar com os problemas. É preciso devolver o aleitamento materno para a família e não podemos prender muitos profissionais de saúde nesse processo. Se o bebê for mamar apenas quando o fonoaudiólogo o avaliar, criaremos uma situação de risco. O fonoaudiólogo nas unidades neonatais tem representado uma grande conquista, mas, às vezes, as crianças que realmente precisam desse profissional não conseguem atendimento porque ele está ocupado com bebês que normalmente iriam mamar por essa ser uma questão de amadurecimento. Certamente, seria ótimo se tivéssemos fonoaudiólogo em todas as unidades neonatais, porque este é um profissional que enriquece a equipe e que é extremamente importante; uma equipe multiprofissional é muito importante para o desenvolvimento do nosso trabalho, e temos cada vez mais que devolver o que for fisiológico para a família.
Podemos também interferir na nutrição da mãe do prematuro, técnica bastante interessante e que deveria ser mais explorada. O uso de castanha-do-pará, do peixe, dos ômegas ajuda nesse processo; podemos fazer algumas orientações nutricionais, conversar com a equipe de nutrição para nos ajudar a melhorar a oferta calórica do leite da mãe para seu próprio filho.
21. Qual é a periodicidade da troca da sonda orogástrica em recém-nascidos?
Depende do tipo de sonda. Por exemplo, se for uma sonda comum que utilizamos, a de PVC, deve ficar por três dias; se for uma sonda de silicone, será de cinco a sete dias. Qual é a diferença das duas? A sonda de PVC pode, em contato com o ácido gástrico, quebrar e lesionar o bebê; então devemos tirá-la a cada três dias.
22. O recém-nascido que demonstra sinais para iniciar a amamentação como deve ser conduzido?
Quando o bebê demonstrar sinais de que quer mamar, a melhor conduta é colocá-lo no peito da mãe, iniciando com a técnica da mama vazia. Observar sinais de estresse e, dependendo da idade do bebê, o acompanhamento do fonoaudiólogo é importante. Se o bebê já está dizendo que quer mamar, então a equipe precisa atendê-lo!
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