Sistematizamos as principais questões sobre Prevenção de Extubação Acidental ou Não Planejada no Recém-nascido em Ventilação Mecânica, abordadas durante Encontro com as Especialistas Cristiane Sanches, enfermeira neonatologista da Unicamp, e Vivian Azevedo, fisioterapeuta da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), realizado em 28/02/2019.
Veja também: Postagem sobre o tema
Recém-nascidos criticamente enfermos, internados em UTIs neonatais, frequentemente necessitam de intubação e ventilação mecânica. Estima-se que cerca de 80% dos recém-nascidos com extremo baixo peso são tratados com ventilação mecânica invasiva durante os primeiros dias de vida e, mesmo aqueles que inicialmente recebem suporte ventilatório não invasivo, são intubados em algum momento da internação.
A manutenção dos recém-nascidos com via aérea artificial é uma prática segura, mas que não os isenta de complicações como extubações não planejadas, um dos eventos adversos mais frequentes em unidades de terapia intensiva neonatais.
A Extubação acidental ou Extubação não planejada (ENP) é qualquer extubação inesperada ou realizada em um momento não programado, decorrente da agitação do paciente ou do manuseio da equipe.
As extubações acidentais devem ser evitadas pois podem trazer graves consequências ao paciente, como aumento do tempo de ventilação mecânica, aumento do risco de hipoxemia, atelectasia, pneumonia associada a ventilação mecânica, trauma de vias aéreas, instabilidade hemodinâmica, arritmias e parada cardiorrespiratória.
Desta forma, toda extubação acidental deve ser notificada como um evento adverso e deve ser analisada para sabermos como, por que e em que momento ocorreu como forma de evitar novos episódios através da melhoria assistencial.
A melhor forma de prevenirmos a ocorrência de extubação não planejada e suas complicações é a avaliação diária:
- Qual a necessidade do paciente permanecer em ventilação mecânica invasiva? Por que não o CPAP???
- Já foi avaliada a possibilidade de extubação?
- Será que estamos avaliando de forma adequada o momento do paciente ser extubado?
Estas questões devem ser uma reflexão permanente da equipe assistencial.
Abaixo a gravação do Encontro na íntegra.
O Encontro com o Especialista é uma webconferência realizada quinzenalmente com especialistas de diversas áreas. Para participar é necessário se inscrever no evento, assim você poderá enviar dúvidas que serão respondidas ao vivo!
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Perguntas & Respostas
1. Como manter o paciente sem sedação e evitar uma extubação acidental?
É importante a gente se lembrar de que o que não é orientado é manter todos os recém-nascidos em sedação contínua. A avaliação desse recém-nascido deve ser individualizada; há recém-nascidos que necessitam de sedação sim.
Outra questão importante é a avaliação da dor; às vezes o recém-nascido está agitado por causa de dor, então a equipe ter a avaliação de dor é muito importante.
É fundamental que esse recém-nascido esteja bem posicionado, contido de uma maneira adequada e confortável; usamos rolinhos confortáveis, em volta do RN, como ninho; colchão confortável; às vezes é necessário cobrir o bebê quando for possível (por exemplo, quando não estiver em fototerapia). Assim, os recém-nascidos ficam mais confortáveis e menos agitados, evitando-se as extubações não planejadas.
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2. Quais as principais causas de extubação não planejada?
As principais causas e fatores de risco de extubação não planejada descritos na literatura são principalmente:
Um estudo brasileiro avaliou o momento em que a extubação não planejada ocorria, demonstrando que 67% dos eventos ocorreram durante a realização de procedimentos, tais como: troca de fixação (27%), a aspiração de via aérea (22%), durante a realização de radiografias, na mudança de decúbito e passagem da sonda nasogástrica. Alterações anatômicas das vias aéreas e face também podem contribuir para extubações não planejadas.
3. Quais os sinais clínicos e físicos de extubação acidental do recém-nascido?
Os principais relatados na literatura são:
4. Como e qual material vocês usam para fixar a cânula? Vocês colocam a fixação da sonda em cima da fixação do tubo?
Estamos usando há algum tempo a atadura elástica Tensoplast®. Para fazer a fixação, lembramos que os pontos são média orelha a orelha, deixando um espaço pequeno para não atingir o lóbulo da orelha, e o ponto de centralização da cânula é de 3 a 4 cm em espiral. Dobramos a pontinha para termos um apoio na hora de retirar ou de trocar essa fixação para que não tenhamos que fazer muita força ou tração para iniciar a remoção da cânula. Também realizamos um preparo da pele para fixar, limpando-a com soro fisiológico, secamos sem fazer muita fricção e fixamos a fita adesiva. Como a criança já está entubada, colocamos a fixação da sonda em cima da fixação do tubo, mas não fixamos a sonda junto com o tubo, ou seja, não juntamos as duas cânulas. Isso também não seria possível, porque a maioria das nossas crianças é entubada por via nasotraqueal, então a sonda fica via orogástrica até a criança ser extubada. Só passamos para a sonda via nasogástrica depois que a criança tiver estabilidade e via aérea livre. Quando extubamos o bebê, aí sim fixamos a sonda conforme a recomendação da metodologia canguru, deixando livre o espaço da cavidade oral e bochechas, fixando a sonda em cima, no formato de gatilho.
Não existe, ainda, um guideline da melhor fixação. Então, existem algumas fixações previamente fabricadas que são comercializadas, mas não há ainda na literatura algum estudo que mostre o benefício desses tipos de fixação em relação às fixações convencionais. Usamos o material Tensoplast® nas várias formas de fixação, também usamos no formato de H, fixando no lábio e depois fazendo uma espiral com as duas perninhas do H. Mas não existe diferença com o material comercializado.
Também gostaria de acrescentar que não existe, na literatura, maior risco na via de intubação; então, não há diferença, nos indicadores de extubação não planejada, entre a via orotraqueal ou a via nasotraqueal. Como a maioria das nossas crianças é entubada via nasotraqueal, percebemos que para a gente acaba sendo mais fácil a fixação da cânula via nasotraqueal do que via oral; a via oral causa mais tensão no profissional e apresenta um risco maior de deslocamento. Mas isso pode ser uma particularidade nossa, porque a maioria das nossas crianças é por via nasotraqueal, e desenvolvemos mais habilidade para trocá-la. Mas na literatura, realmente, não existem evidências sobre isso. É importante enfatizar, inclusive, as outras complicações. Sobre a lesão de pele, por exemplo, num serviço que não tem experiência na intubação nasotraqueal, pode ocorrer lesão de septo e nasal. Assim, na literatura, em relação à extubação não planejada, não há uma vantagem de via de intubação.
5. Existe algum escore de risco para avaliação da extubação não planejada?
Existe um artigo publicado em 2017, na Pediatric Critical Care Medicine*, que cita como escore de risco alguns fatores de risco como a anatomia (as crianças que tem malformação), a agitação e o uso de sedação, o excesso de secreção oral, se aquela criança é submetida a vários procedimentos e transporte, se já teve algum histórico de extubação não planejada, se está em protocolo de extubação e se o paciente fica muito em posição prona e se precisa trocar a fixação com frequência. Ele coloca algumas pontuações para esse escore, e na sua conclusão esse escore teve associação com maior ou menor risco de extubação planejada. Esse artigo é muito interessante.
*Artigo de acesso restrito
6. Quais intervenções para prevenção de extubação não programada vocês consideram ser as de maior impacto?
Para pensarmos em prevenção, no primeiro momento devemos pensar sobre a fixação da cânula ou tubo endotraqueal, como e com que material ela é feita. Hoje, existem no mercado produtos específicos para a estabilização e fixação do tubo endotraqueal e que apresentam bons resultados nos serviços que os utilizam, entretanto a disponibilidade destes materiais não é a realidade na maioria dos hospitais brasileiros. Temos fitas adesivas que podem fazer a fixação da cânula, mas precisamos levar em consideração a qualidade das mesmas pois devem oferecer boa fixação e aderência sem provocar lesões na pele do recém- nascido.
Na nossa realidade, a fixação mais adequada seria realizada com duas tiras de fitas que vão de orelha a orelha, uma fazendo uma base seguindo sobre ela e, ao chegar ao tubo, fixa-lo fazendo algumas voltas em espiral em torno do mesmo e depois seguir novamente sobre a base. Após o posicionamento e fixação adequados, a prevenção da extubação começa com o estabelecimento de programas de qualidade e melhoria em serviço, ou seja, treinamentos em serviço das equipes assistenciais, discussão de casos, avaliação diária da fixação e dos circuitos, evitar o acúmulo de água no circuito e avaliação da necessidade específica de sedação do paciente. Outros cuidados incluem a informação da equipe sobre em que posição, em centímetros, a cânula está idealmente fixada, o manuseio por dois profissionais durante a realização de procedimentos específicos, especialmente na troca de fixação e aspiração do tubo e o dimensionamento adequado da equipe assistencial ao número e complexidade dos leitos.
7. Qual a melhor maneira de higienizar a pele para realizar a troca da fixação? Qual material para fazer a fixação da cânula endotraqueal?
O material que usamos para fazer a remoção da fita adesiva é específico para essa remoção de adesivo. Existem alguns produtos no mercado, já usamos duas ou três marcas diferentes, e existem produtos, inclusive que dispersam cheiros e que tem um resultado muito bom. Então, você aplica o produto no adesivo e ele solta com muita facilidade; e o que é melhor ainda: não deixa resíduo, não deixa a pele com prejuízos para a nova fixação. Conseguimos, assim, soltar o adesivo e ter uma pele pronta para colocar o próximo adesivo. O material que usamos para fazer a fixação é a fita elástica, e um dos produtos que conheço para a remoção de adesivos está em falta no Brasil, mas existem dois disponíveis para aquisição.
8. Quais os cuidados para evitar extubação durante o canguru?
Há publicações sobre ser possível, sim, fazer a posição canguru, o contato pele a pele do recém-nascido com mãe ou pai, mesmo estando em ventilação mecânica, mesmo estando entubado.
A melhor forma é colocar a tubulação atrás do pescoço de quem está segurando a criança, fixar a traqueia, e o bebê ficar do outro lado; até o próprio ombro da mãe fica seguro, é importante que ela esteja bem posicionada e confortável. Um momento em que ocorre muito a extubação não planejada na posição canguru é no momento de transferência desse bebê. Na literatura há relatos de dois tipos de transferência: um que a mãe pega o bebê e o outro é quando ela fica sentada, já posicionada (lembrando que é um contato pele a pele, e não pano a pano) para receber o bebê.
Temos observado que, quando a mãe já está sentada e já fica preparada para receber o bebê, temos menos casos de eventos adversos. Lembrar, também, que é um procedimento que deve ser realizado por mais de um profissional; então apenas um profissional sozinho para pegar o bebê, pegar a tubulação e o tubo já é um fator de risco. Assim, a equipe já deve estar programada com pelo menos dois profissionais para realizar esse procedimento para evitar a extubação não planejada. Antes de movimentar, antes de fazer a transferência do bebê da incubadora para o pele a pele, é preciso checar a aderência do adesivo para não fazer a movimentação com adesivos levemente afrouxados em que se observa o risco de extubação. Caso perceba isso, troque a fixação e depois posicione o bebê no pele a pele.
9. Gostaria de saber sobre o controle das extubações através de indicadores de qualidade para a fisioterapia.
Dentro dos indicadores ela é importante e, no caso das não planejadas, nós temos uma planilha em que todos os bebês em ventilação estão relacionados e, diariamente, acrescentamos ou excluímos pacientes que entraram ou saíram da ventilação. Se o paciente teve uma extubação não programada naquele dia, circulo que ele teve uma extubação e acrescento informações no rodapé necessárias naquele momento; isso se o profissional estiver presente no momento da extubação.
Se não estiver, o profissional que está envolvido no cuidado faz a não conformidade com a notificação, relatando a ocorrência para a secretaria do serviço e seguindo para o setor de segurança do paciente.
Com o fechamento da coleta desses dados, fazemos a devolutiva desse resultado para a equipe e trabalhamos com a equipe no geral.
Quando identificamos que o evento ocorre com mais frequência em determinado período, temos que entender o que está acontecendo naquele turno que contribui para que o evento tenha maior evidência. Assim, chamamos os profissionais envolvidos na assistência para tentar elucidar a ocorrência e é feito o treinamento também em serviço, com todos os profissionais envolvidos. Os indicadores são divulgados para a equipe pelo núcleo de segurança.
10. Qual o papel do fisioterapeuta na atuação da prevenção?
O fisioterapeuta deve trabalhar em equipe, estar junto com a equipe de saúde, envolvido com médico, com a enfermagem, na prevenção de extubação e de todos esses fatores de risco.
Em muitos serviços, há fisioterapia 24 horas, que é responsável, inclusive, por todas as trocas de fixação, pela mudança de posicionamento de tubo, e, mesmo em serviços que não seja 24 horas, a fisioterapia deve estar sempre compartilhando as informações com a equipe de saúde.
É importante, também, o fisioterapeuta estar envolvido nessa avaliação de indicadores de qualidade e saber quais são os principais fatores que, na unidade de atuação, estão contribuindo para a extubação não planejada.
11. Tem imagem da fixação da cânula e algum artigo que fale desta fixação?
Esta apresentação de slides está disponível aqui no Portal, assim como os artigos relacionados:
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