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Principais Questões sobre Amamentação do Pré-termo

7 jun 2023

Sistematizamos as principais questões abordadas durante Encontro com a Especialista Nicole Gianini, médica neonatologista da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (SMS/RJ), realizado no dia 11/08/2022. Texto atualizado até a data desta postagem e conteúdo adicional incorporado.

O nascimento de um recém-nascido (RN) pré-termo é uma emergência nutricional. A condução que diz respeito à nutrição terá impacto no desempenho da criança na unidade neonatal e em toda a sua vida.

A nutrição para o pré-termo é de fundamental importância visto que essas crianças ainda estão em desenvolvimento, e nasceram antes de completar adequada formação dos órgãos.

A nutrição pelo trato gastrointestinal (TGI) é um importante estímulo para que o intestino se desenvolva. A dieta pelo TGI é importante porque:

  • Aumenta o crescimento da mucosa do trato gastrointestinal;
  • Estimula os hormônios do trato gastrointestinal;
  • Melhora a motilidade intestinal e a tolerância à dieta;
  • Melhora o crescimento do recém-nascido;
  • Reduz a necessidade de fototerapia;
  • Diminui a colestase;
  • Diminui a osteopenia.

Além da importância da nutrição para o desenvolvimento do TGI, há, também, importância para a microbiota intestinal e, consequentemente, para o microbioma do RN.

  • Microbioma é a população de microorganismos do trato gastrointestinal dos mamíferos. Ele tem papel fundamental na nutrição, no metabolismo, na proteção contra os patógenos e na proteção do sistema imune.
  • Estima-se que há pelo menos 1.000 diferentes bactérias no trato gastrointestinal dos humanos. Mais de 3 milhões de genes foram identificados neste microbioma.
  • Durante o trabalho de parto o contato com a microbiota vaginal e intestinal é importante para o recém nascido e nos casos de parto cesáreo é fundamental que se garanta a amamentação na primeira hora de vida dessas crianças.

Nesse sentido, não há indicação de dieta zero para prevenir enterocolite. Ao contrário, iniciar precocemente e manter o recebimento de nutrientes no trato gastrointestinal, além de todos os benefícios citados, reduz a incidência de enterocolite necrosante.

Já existe evidência suficiente para concluir que a melhor prática é iniciar a dieta enteral o mais rápido possível (se as condições clínicas do bebê permitirem – malformação do trato intestinal por vezes demanda postergar), assim como realizar o seu incremento em maior velocidade (ml/kg/dia). O volume de incremento pode ser de 30 a 35 mL/kg/dia.

O melhor leite para o recém-nascido, independente da idade gestacional, é o leite da própria mãe, pois garante os nutrientes adequados para ele.

O leite materno é muito importante:

  • Pela qualidade da proteína presente no leite materno;
  • Porque contém lipídio estruturado para o prematuro;
  • Pela presença do Inositol, que é uma substância que existe somente no leite humano e previne doenças pulmonares crônicas;
  • Possui fatores de crescimento;
  • Promove o esvaziamento gástrico mais rapidamente;
  • Possui IgA, lactoferrina, lisozima e anticorpos específicos;
  • Proteção contra enterocolite necrosante;
  • Possui hormônios/enzimas adequadas ao recém-nascido pré-termo.
  • Oligossacarídeos, que são o terceiro componente mais abundante no leite materno, atrás apenas da lactose e dos lipídios. Os oligossacarídeos funcionam como prebióticos e interagem com a microbiota intestinal direta ou indiretamente, sendo suporte para crescimento de bactérias benéficas e anti-patógeno de bactérias indesejadas, além de modular a  resposta do epitélio intestinal. Os oligossacarídeos reduzem os riscos de enterocolite necrosante, alergia e doença autoimune e têm papel crucial no desenvolvimento cerebral.
  • Os microRNAs encontram-se nos exossomos que são vesículas de 30-90nm secretadas para o meio extracelular por vários tipos de células de mamíferos. As secretadas pela célula mamária são chamadas de MEVs nessas vesículas (MEX – Milk exosome) há microRNAs. O MEX e os micros RNAs atingem a circulação e têm impacto na epigenética, programando seu funcionamento e o funcionamento de vários órgãos como fígado timo, cérebro, ilhas pancreáticas, osso e tecido adiposo.
  • O exossoma do leite materno (MEX) tem implicação no crescimento, maturação, programação metabólica e sistema imunológico.
  • O leite da mãe de prematuro tem composição diferenciada, sendo vital que seja garantido ao recém nascido.

Atenção: o leite materno não é apenas amamentação. O leite materno é programação biológica, metabólica, endócrina e imunológica!

 

Colostroterapia

  • A Colostroterapia é a estratégia utilizada na fase inicial quando o RN está instável e a mãe ainda não apresenta uma boa produção de leite. Deve ser iniciada nas primeiras horas de vida.
  • O contato com o colostro, que é colocado em cada face interna da cavidade oral, serve como uma forma de atapetar a mucosa do recém-nascido com uma microbiota saudável (a materna) e oferecer as demais propriedades do leite materno.
  • A Colostroterapia não substitui a dieta pelo trato gastrointestinal de forma precoce. Ambas são importantes e devem ser instituídas.

 

Dieta Enteral

  • Por características próprias da prematuridade, o recém‑nascido pré‑termo, inicialmente, não consegue alimentar‑se por meio da sucção, sendo necessária a utilização da dieta enteral.
  • A sonda gástrica é colocada nos recém-nascidos para garantir a oferta da alimentação e pode ser nasogástrica ou orogástrica. Há momentos no plano terapêutico em que uma ou a outra será a melhor decisão. Deve ser uma tomada de decisão multidisciplinar e singular para cada RN.
  • A gavagem simples é a forma mais comum de alimentar os recém-nascidos de baixo peso. Sabe-se que ocorre uma resposta hormonal cíclica, mesmo em volumes muito pequenos, é mais fisiológica.
  • Durante a alimentação por gavagem simples, é importante iniciar um programa de estimulação oral, que deve priorizar o contato precoce do recém-nascido ao peito para facilitar a interação e a aprendizagem da amamentação entre mãe e filho, respeitando os limites de cada recém-nascido.
  • Pode-se utilizar também a técnica de sucção não nutritiva, com supervisão da equipe multidisciplinar.
  • Não se recomenda a verificação de resíduo gástrico.
  • A alimentação transpilórica não deve ser recomendada rotineiramente e é indicada apenas para crianças com refluxo gastroesofágico grave, intolerância gástrica significativa e em situações de pós-operatório.

 

Transição da dieta da sonda para a via oral

  • A melhor forma de alimentação é pela sucção ao seio materno, pois é uma forma de estimular o recém-nascido. Na sucção o recém-nascido precisa coordenar a sucção-deglutição-respiração, apresentar os reflexos primitivos e apresentar sinais de prontidão.
  • A decisão de permitir a sucção não pode ser baseada apenas no peso e na Idade gestacional. Cada recém-nascido será avaliado individualmente. A estratégia de permitir a sucção antes de 33 semanas de IG corrigida é segura.
  • A crença de que a sucção gera ganho de peso insuficiente não é verdadeira.
  • No processo de amamentação do pré-termo, na transição da sonda para o peito, é fundamental a participação da equipe para compartilhar o conhecimento com a mãe/familiar sobre a importância do leite materno.
  • O manual Técnico do Método Canguru, recomenda que a transição seja realizada seguindo os passos: sonda, mama vazia, translactação/relactação e o uso do copinho somente na ausência da mãe.

 

Perspectivas para garantir o aleitamento do pré-termo

  • O Método Canguru é um modelo de atenção perinatal voltado para a atenção qualificada e humanizada que reúne estratégias de intervenção biopsicossocial com uma ambiência que favorece o cuidado ao recém-nascido e à sua família. Preconiza-se no Método a participação dos pais e família nos cuidados, realização de cuidados contingentes e individualizados e a realização da Posição Canguru – pele a pele.
  • O Método Canguru é benéfico para o recém-nascido, para a família e para a equipe. É baseado em evidência científica, é um processo assistencial seguro, que favorece e aumenta a amamentação.
  • O estímulo à amamentação e o fortalecimento de vínculos devem ser estimulados ainda na primeira etapa do Método.
  • Estímulo à extração de leite à beira leito.
  • O apoio da equipe interdisciplinar, junto à família, é fundamental para a garantia dos direitos da família e do recém-nascido.
  • Integrar o trabalho da Unidade Neonatal com o Banco de Leite e dar alta ao recém-nascido vinculado ao banco de leite sempre que necessário.
  • Ter um projeto terapêutico singular para cada família/recém-nascido.
  • Manter a equipe sensibilizada sobre a política de Atenção Humanizada ao Recém‑Nascido – Método Canguru e com conhecimento sobre seus benefícios.

Por todas essas considerações,  é fundamental que a amamentação do pré-termo esteja em destaque no plano terapêutico do bebê. Presença do pai e da mãe, suporte e empenho da equipe em garantir a extração do leite materno, a imunoterapia (colostroterapia para além da fase de colostro) – mesmo quando já está com dieta gástrica plena, colocar no peito (mesmo no CPAP) para encostar no mamilo e oportunizar o contato com a microbiota local e, com o auxílio da  equipe iniciar a sucção não nutritiva. O empenho genuíno na garantia da manutenção da amamentação faz toda a diferença para que tenhamos o pré-termo em aleitamento materno – garantia de um desenvolvimento melhor.

Abaixo, a gravação do Encontro na íntegra.

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Perguntas & Respostas

 

Referências:

  • Fiocruz. Rede Global de Bancos de Leite Humano. Norma Técnica 47.18. Uso do Leite Humano Cru Exclusivo em Ambiente Neonatal.
  • Gianini, NOM. Seção II – Abordagem nutricional, hidratação venosa e distúrbios metabólicos no recém-nascido. Capítulo 6. Nutrição enteral e parenteral no recém-nascido. Patrícia de Padua Andrade Campanha; Arnaldo Costa Bueno. In: Neonatologia (Série Pediatria Soperj). Ed. Manole. 2022.
  • Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Primária à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Método canguru : diretrizes do cuidado – 1ª ed. revisada – [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – Brasília : Ministério da Saúde, 2018. 80 p. Disponível em: Método canguru : diretrizes do cuidado – 1ª ed. revisada (saude.gov.br)

 

Como citar

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira. Portal de Boas Práticas em Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente. Postagens: Principais Questões sobre Amamentação do Pré-termo. Rio de Janeiro, 07 jun. 2023. Disponível em: <https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/atencao-recem-nascido/principais-questoes-sobre-amamentacao-do-pre-termo/>.

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