Sistematizamos as principais questões sobre Controle térmico do recém-nascido pré-termo, abordadas durante Encontro com as Especialistas Odália Uidack e Caroline Pavlu Moraes, enfermeiras neonatologistas da maternidade Perinatal, em 16/08/2018. Veja também: Postagem sobre o tema
A temperatura corporal é o resultado do balanço entre os mecanismos de produção e de eliminação do calor. Nos recém-nascidos, especialmente em pré-termo, pode ocorrer desequilíbrio desses mecanismos, com aumento nas perdas e limitação na produção.
A capacidade de manter constante a temperatura corporal quando a temperatura ambiental varia é limitada no recém-nascido e o estresse do frio ocorre quando a perda de calor excede a capacidade de produção. O controle térmico depende da idade gestacional e pós-natal, do peso de nascimento e das condições clínicas do recém-nascido e, quanto menor a idade gestacional e pior o estado clínico, maior será a necessidade de suporte térmico ambiental para mantê-lo normotérmico.
Gravação do Encontro na íntegra.
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1) Em muitas unidades, ainda vemos o uso do berço de calor radiante. Qual é a sua experiência no uso desses berços? Em quais situações eles são utilizados por vocês?
Na unidade neonatal, quando a gente sabe que será admitido um bebê com peso abaixo de 1 kg ou com idade gestacional até 28 semanas, já deixamos uma unidade de calor radiante esperando por ele, montada e aquecida. Então, recebo esse bebê já com o material de cateterismo todo pronto; fizemos um check-list de montagem de leito que ajudou bastante e recomendo muito esta prática. Assim, hoje, quando sou a enfermeira na UTI neonatal e recebi a informação do nascimento de um bebê prematuro, vou para o meu check-list e vejo tudo o que preciso ter no leito; eu checo antes dele chegar para não haver demora na admissão desse bebê. O ideal é o cateterismo acontecer na primeira hora de vida e colocamos na incubadora umidificada se necessário ou não, idealmente uma incubadora de parede dupla, o mais rápido possível; não permanecemos com o bebê na UCR. Só mantemos na UCR para fazer os primeiros cuidados e, logo que pudermos, colocamos na incubadora umidificada ou não (depende da idade gestacional do bebê).
2) Em quais situações vocês encontraram maior dificuldade para melhora das questões ambientais que interferem na temperatura do bebê? E a temperatura da sala no centro obstétrico?
A temperatura do centro obstétrico tem que ficar em torno de 26 graus e a dificuldade maior, infelizmente, está na equipe e existem, logicamente, algumas questões estruturais. Na nossa unidade, conseguiram trocar os focos por lâmpadas frias para que a equipe também possa ter um conforto naquele momento difícil como é o do nascimento, mas a equipe precisa se conscientizar que está nascendo ali um bebê que requer esse controle. Então, a gente vem trabalhando com os times e damos o retorno para a equipe obstétrica com informações sobre o quanto de temperatura nasceu a criança, o quanto de temperatura ela chegou à UTI, dando à equipe o retorno do seu trabalho também. Esta é uma forma de mantê-los envolvidos no processo. Logicamente, essa é uma campanha que começa dentro da maternidade, você vai envolver a família e a mãe já vai para o centro cirúrgico com essa informação que também será retornada para o obstetra, senão vamos perder essa informação. O mais importante é envolver toda a equipe que vai atender a família para conscientizá-la da seriedade disso. Nós fizemos um treinamento com a equipe e falar sobre temperatura não é simples, pois há situações tão complicada que, às vezes, um minuto é fundamental. Sabemos que o bebê perde 0,3 graus por minuto. Então em 3 minutos ele já perdeu 1 grau; se ele nasceu com 36oC, então já vai chegar na UTI com 35oC, apenas no tempo do transporte do centro obstétrico para a UTI neonatal e aí já teremos as complicações associadas.
Algo interessante que fizemos dentro do centro cirúrgico e que é bom compartilhar foi mexer com a equipe que está lá dentro (sei que para eles o ideal é ficar num ambiente fresco porque estão num procedimento cirúrgico, encapotados), mas criamos um ranking dos pediatras que mais mantêm o bebê quentinho. Isso foi bem interessante, porque eles começaram a competição entre eles e cobrar da equipe da obstetrícia para manter a sala na temperatura adequada; diminuímos a temperatura depois que o bebê já não está mais na sala. Essa foi uma medida que deu uma repercussão boa e conseguimos controlar melhor a temperatura de sala.
3) Qual a experiência de vocês na utilização de umidificação nas incubadoras?
Sabemos que há diferenças em várias instituições, aqui fazemos a utilização por 5 dias de incubadora umidificada apenas, mas com algumas exceções. Se estou com um pré-termo extremo já no quinto dia, com 70% de umidificação, para finalizar este processo, vou desligando mas controlando a temperatura. Caso ele não consiga chegar à temperatura adequada que eu quero, mantenho a umidificação por mais dias.
Então, são 5 dias de umidificação, começamos com 80% por 3 dias, depois reduzimos para 70%. Com certeza, entre uma unidade e outra deve haver uma variação nesses valores, mas em geral é isso; no quinto dia a gente suspende de acordo com a temperatura. O pré-termo extremo com certeza vai requerer mais tempo, porque ele não consegue manter a temperatura; a sua pele é muito fina, há riscos de lesões e, mesmo que você tenha o controle hídrico (isso é importantíssimo para que tenhamos melhores condições de tratamento ao bebê), ainda assim sabemos dos riscos que podem acontecer a essa pele.
4) Como vocês monitoram a efetividade das ações implementadas para controle térmico do recém-nascido pré-termo?
Fazemos isso através de um protocolo onde estabelecemos as nossas metas e é daí que a gente acompanha. Assim, começamos com a temperatura materna: com todos os bebês abaixo de 1,5 kg controlamos com qual temperatura a mãe foi para a o centro obstétrico (colocamos como meta 36,2oC); se nossa monitoração estiver fora ou dentro da meta, analisamos as possíveis causas desta falha com as equipes envolvidas para definir e realizar ações para corrigir estas falhas e melhorar este resultado. Depois analisamos a temperatura de sala cirúrgica (a ideal é 26 oC), verificamos o motivo de ter ficado fora, se caso tenha ocorrido isso, e quais as ações podemos tomar. Posteriormente, verificamos a temperatura de nascimento desse bebê (a ideal é 36,5 oC) e controlamos se ele recebeu oxigênio aquecido de fato, ou se não recebeu; se não recebeu, discutimos o que aconteceu para isso. Utilizamos também um colchão para aquecimento desse bebê; fizemos uma adaptação ao colchão, usando um aquecedor de mamadeira para ajudar na manutenção da temperatura do bebê prematuro que sabemos ser o mais complicado. Assim, controlamos se fizeram o uso desse colchão, ou não. Igualmente, verificamos a temperatura com que o bebê chegou na UTI neonatal. O fim do protocolo é o tempo de estabilização da temperatura desse bebê aqui dentro. Essas são as metas do nosso protocolo que acompanhamos e tomamos medidas corretivas relacionadas aos desfechos negativos que não queremos. Também controlamos os desfechos relacionados a todos os bebês prematuros, se monotérmicos ou hipotérmicos, e quais foram os desfechos negativos que tivemos relacionados a esses bebês que não tiveram o protocolo estabelecido de forma adequada.
5) Quais as principais complicações decorrentes da umidificação e o que vocês fizeram para evitá-las?
Quando começamos a trabalhar com umidificação, iniciamos por um período de 7 a 10 dias e observamos que a pele de alguns bebês prematuros extremos (mesmo com a taxa hídrica calculada) tendia a apresentar lesões e algumas dessas lesões eram muito úmidas, então era extremamente complicado trabalhar dessa forma. Também trabalhávamos com a umidificação em torno de 95%, mas às vezes você não conseguia ver bem aquele bebê e prestar os cuidados a ele se tornava muito complicado. Por isso, hoje a gente trabalha com a umidificação de 80% por 3 dias e 70% por 2 dias, finalizando no quinto dia. E no momento em que você presencia uma lesão na pele do bebê, começam os cuidados e o tratamento dessa lesão. A diminuição da umidificação ajuda a tornar esta lesão um pouco mais seca para que possa iniciar o processo de queratização de toda essa pele que ainda está num momento de estruturação (que é um processo longo e difícil nesses bebês muito pequenos).
6) Boa tarde! Em relação ao aquecimento do RN pré-termo, como fazer nos casos da asfixia perinatal?
Entendi que a pergunta se refere a hipotermia terapêutica que a gente faz nos casos de asfixia neonatal, mas no bebê prematuro extremo nós não fazemos este procedimento, apenas naqueles recém-nascidos com mais de 35 sem. Então, neste grupo continuamos mantendo o aquecimento dele como o preconizado em 36,5 oC e temos um olhar melhor para esse bebê não fazer hipertermia (de forma alguma); entendemos que os malefícios ocasionados pela hipotermia nesses bebês são muito maiores do que o fato de acharmos que a proteção neurológica é maior.
Nos prematuros com idade gestacional ≥35 semanas, que podem ser submetidos a hipotermia terapêutica o reaquecimento é preconizado na velocidade máxima de 0,5oC/ hora até chegarmos na temperatura alvo de 36,5 oC.
7) Quais os cuidados com a mãe no alojamento conjunto e nas UTIs para auxiliar na manutenção da temperatura do bebê?
Falando primeiramente do banho do bebê no berçário que é uma questão que trabalhamos muito para melhorar todos os dias. Hoje, sabemos, pela literatura, que em torno de 55% dos bebês entre 22 e 33 semanas chegam às UTIs com hipotermia. Na nossa unidade, a gente observava que 60% de bebês a termo chegavam hipotérmicos, isto considerando que o nosso alvo é a temperatura de 36,5oC (muitas pessoas ainda consideram como 36oC como uma temperatura alvo). Tomamos as medidas de prevenção e hoje, quando o bebê à termo apresenta hipotermia e prestamos os primeiros cuidados ou quando vai para o quarto (de acordo com a disponibilidade da família), verificamos a sua temperatura a cada hora. Se ele chega à unidade com menos de 36,5 oC verificamos a sua temperatura a cada hora e de acordo com a recomendação, colocamos esse bebê na incubadora por 2 horas. Porém, algumas pessoas já aquecem, secam e vestem o bebê e ele já vai para o quarto com a mãe. Nestes casos, inicialmente verificamos a temperatura a cada hora, depois a cada duas horas e, quando ela normaliza, a cada seis horas até a alta do bebê. Então a lógica é manter a mãe informada sobre essas questões, manter a temperatura ambiente em torno de 26 graus, porque é importante o controle térmico do ambiente e o envolvimento da família com relação a isso. O canguru também é muito importante, porque ajuda no controle da manutenção da temperatura, sem contar os resultados super importantes do método canguru.
Quando a gente fala do comprometimento da mãe e o que pode acarretar no bebê, acho que a informação acima de tudo é fundamental. Para a gente tocar e envolver essa mãe e o restante da família, só com informação mesmo.
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